30 de abril de 2023

O segredo pra passar pela Porta Estreita

Tela: La porte ouverte (1902-3), Édouard Vuillard

"Um dos mal-entendidos mais frequentes relativos a Jesus consiste em afirmar que a originalidade de Sua mensagem é a proclamação do amor ao próximo. Nesse ponto, Ele não faz senão retomar o duplo mandamento da Torá: amor a Deus e amor ao próximo. Contrariamente à opinião consagrada, é antes o anúncio da proximidade do Reinado de Deus que está no cerne da pregação de Jesus e, ligado a esse anúncio, o apelo à metanoia, uma mudança radical do pensamento e da atitude", o professor Élian Cuvillier garante em Jesus - A Enciclopédia (Editora Vozes, 2020).

Traduzida comumente por "conversão" ou "arrependimento", metanoia significa literalmente - ainda de acordo com o professor - "pensar às avessas". E é isso o que Jesus propõe a um ouvinte, que Lhe pergunta se são poucos aqueles que se salvam. "Esforçai-vos por entrar pela porta estreita, pois eu vos digo que muitos procurarão entrar e não conseguirão...", Ele exorta.

Em seu livro As Parábolas de Lucas (Edições Loyola, 2005), Michel Gourgues afirma que a porta estreita se refere à exigência de conversão, que são as exigências ligadas ao acolhimento do Reino: "O Evangelho exige transformações, e transformações custosas, que obrigam a longos e pacientes investimentos, como a passagem por uma porta estreita exige esperas e longas filas".

Embora esse autor ressalte que o esforço de conversão é precedido pelo dom de Deus, não basta ter ouvido o ensinamento de Jesus: é preciso também conformar nossa vida com Ele. "Se Deus tem a iniciativa da salvação, Ele não nos salva sem nós." Esse requisito explica, conforme Michel Gourgues, o atrativo menor que a mensagem evangélica exerce em culturas confortáveis como a nossa, pouco acostumadas a esforços de longa duração.

E quanto à audiência na época de Jesus?

A interrogação levantada em Lucas, sobre a quantidade dos que se salvam, refere-se aos beneficiários da salvação entendida no sentido escatológico, ou seja, àqueles que "terão parte no mundo que há de vir". Essa questão também era debatida nos círculos religiosos judaicos. Rinaldo Fabris, em Os Evangelhos II (Edições Loyola, 2006), relata que a teologia rabínica garantia que todo o povo de Israel tomaria parte do reino futuro: "Pode-se contar como filho do mundo futuro o que habita a terra de Israel, fala a língua santa e recita a oração do shemá".

Porém, na passagem bíblica de que ora tratamos, Jesus faz um apelo ao empenho.

"Não há pessoas recomendadas junto a Deus, nem privilegiados que possam se gabar diante Dele com base em sua pertença étnica, cultural ou religiosa", Rinaldo Fabris pontua. "Recusando a conversão, testemunhas da pregação de Jesus não souberam usar a porta de entrada do Reino, onde outros menos favorecidos os substituirão", Michel Gourgues pondera. Ele continua: "A salvação é para todos os que se convertem (não importam quem sejam), isto é, para os que sabem comungar com a vontade de Deus a respeito deles".

Assim, sem direitos de pertença ou privilégios de grupo, Deus chamará os excluídos, os longínquos. Se profetas como Isaías já entreviam essa abertura universal, nas palavras de Rinaldo Fabris, "com Jesus, ela se torna uma realidade". Ele complementa: "A única condição para fazer parte da comunhão salvífica é esta: praticar a justiça". Em outros termos: ouvir os ensinamentos de Jesus e se converter. Eis como se passa pela porta estreita.

Licença Creative Commons
Atribuição: Ana Paula Camargo (acatolica.blogspot.com).
Este trabalho está protegido
por uma LICENÇA CREATIVE COMMONS.
Clique no Link para conhecê-la.