18 de abril de 2023

Vão trabalhar, Criaturas!

Tela: Christ healing the Paralytic at the Pool of Bethesda
(1667-70), Bartolomé Esteban Murillo

Imagem: Le paralytique descendu du toit
(The Palsied Man Let Down through the Roof)
- 1886-94 - James Tissot

Em dois momentos na Bíblia, Jesus ordena a dois paralíticos diferentes: "Levanta-te, toma o teu leito e anda". Há discussões em torno do que Jesus quis dizer com toma o teu leito: afinal, se já deixaram de ser paralíticos, por que deveriam ainda se agarrar a ele?

Há quem sustente, por exemplo, que o leito simboliza um passado que não deveria ser esquecido, a fim de valorizarem a sua nova condição. Pois, para mim, carregar o leito é pôr-se a serviço. É Jesus instruindo que, dali pra frente, esta seria a nova realidade da vida deles: depois de anos deitados, imobilizados, iriam pôr a mão na massa. E a primeira ocupação seria justamente a de dar um destino àqueles leitos agora inúteis.

Mas, o que me chama a atenção mesmo nessas duas passagens bíblicas é a fé.

No caso do primeiro paralítico, relatado por São Lucas, foram "algumas pessoas" que o levaram até Jesus, que ensinava na Galileia, numa casa repleta de gente. Pra que pudesse ser visto, aquelas pessoas subiram no telhado, fizeram uma abertura, em seguida ergueram o leito, depois desceram-no até Jesus que, impressionado com todo esse esforço, chamou o paralítico de "meu amigo" e lhe perdoou os pecados...

... Para horror dos fariseus e doutores da Lei que, "vindos de todas as localidades da Galileia, da Judeia e de Jerusalém", estavam ali presentes. Afinal, para eles, Jesus blasfemava, pois só Deus pode perdoar pecados. Vendo tamanha inquietação e para mostrar-lhes que tem sim poder de perdoar pecados, Jesus ordenou ao paralítico: "Levanta-te, toma o teu leito e vai para tua casa". E ele foi, dando glórias a Deus.

Quanto ao segundo paralítico, de acordo com o evangelho segundo São João, é Jesus quem vai até ele, que estava junto ao tanque de Betesda, em Jerusalém. Na sua companhia, havia "um grande número de enfermos, de cegos, de coxos e de paralíticos", que esperavam o movimento da água - pois existia uma crença de que, vira e mexe, um anjo a agitava e quem entrasse primeiro no tanque seria curado de toda doença.

Ao ver o paralítico, que sofria há 38 anos, Jesus lhe perguntou: "Queres ficar curado?". Adoro este trecho. Em vez de dizer simplesmente "Sim!", o paralítico explica que não tem ninguém pra colocá-lo dentro do tanque quando a água se move e blá, blá, blá. Então Jesus, cheio de objetividade e pragmatismo, ordena-lhe: "Levanta-te, toma o teu leito e anda". Como se dissesse: "Que tanque que nada! Eu resolvo o teu problema agora".

Pois foi o que o paralítico fez: tomou o leito e... Andou. Ou melhor: pôs a mão na massa. Em pleno sábado, dia de repouso para os judeus que, ao verem-no carregando o leito (gesto que consideravam uma espécie de trabalho), indignaram-se. Porém, o ex-paralítico retrucou dizendo que só estava obedecendo Aquele que o curou. O bonito é que, mais tarde, Jesus o reencontra no templo. Ou seja: lugar de oração. Aquele ex-paralítico era mesmo um homem de fé.

Tal e qual na Galileia, os judeus em Jerusalém questionaram Jesus, que Se justificou: "Meu Pai continua agindo até agora e eu ajo também"; deixando-os duplamente irados, pois não só Ele estimulava a violação do descanso do sábado, como dizia que Deus era Seu Pai, fazendo-Se igual a Deus.

Essas duas histórias ilustram o que foi a vida de Jesus encarnado: promover a cura e a libertação e, ao mesmo tempo, lidar com a incredulidade e as ameaças de alguns judeus. Sim. De alguns. Pois houve outros tantos - como os dois paralíticos - que não duvidaram. Aproximaram-se, creram e então receberam exatamente o que buscavam. Mesmo imobilizados, deram um salto na fé.

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Atribuição: Ana Paula Camargo (acatolica.blogspot.com).
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