29 de agosto de 2011

Duas reportagens que me chocaram

Duas jornalistas trazem à tona discussões sobre a ÉTICA:
na primeira, mães decidem matar um dos filhos;
na segunda,
um engenheiro vende trabalhos plagiados a terceiros

(Fotografia de Petr Kratochvil)

Sempre tive dificuldade de escolher. Quando meus pais me diziam "Só tem dinheiro para um. Decida-se", eu entrava em pânico. Queria os dois ou os três. Queria tudo. Quando comecei a trabalhar e a ter o meu dinheiro, se gostava de um artista, não queria apenas o seu mais recente CD, mas todos os que ele lançou. Eu dava cheque pré-datado, dividia de mil vezes e levava tudo o que houvesse. Porque era impossível (para mim) ficar com um só. Porque para coisas bonitas, como a arte, sou partidária do "quanto mais, melhor".

Ontem, folheando a revista Época desta semana (29 de agosto de 2011 - Nº 693), descobri algo que me desconcertou. Há pessoas neste mundo bem diferentes de mim: elas têm habilidade e precisão para escolher. Para elas, ainda que se diga respeito não a objetos, e sim a algo valioso e bonito como A Vida, "quanto menos, melhor".

O que quero dizer é: de acordo com a reportagem Destruição assistida, da jornalista Cristiane Segatto, há pessoas neste mundo que optam por qual dos dois fetos, dentro de uma barriga, durante uma gravidez, deve sobreviver. Isso mesmo que você leu. Por razões sobretudo econômicas, a mãe dá cabo do outro, esteja ele se desenvolvendo saudavelmente ou não, através de um processo denominado "meio aborto".

É difícil nos dias de hoje sabermos de algo que realmente nos choque. É que a banalização da violência, da corrupção, da impunidade, da vulgaridade, da falta de respeito e da imoralidade é tanta, que temos a sensação de "já ter visto de tudo". É raro conhecer algo e chegar à conclusão: "Nossa. Agora fiquei sem chão". Pois foi essa a reação que tive, internauta d'A Católica, ao terminar de ler a matéria da revista.

Dois trechos, particularmente, me abalaram. Em um, a jornalista descreve o procedimento do "meio aborto" (atenção, as linhas a seguir são fortes):

A redução embrionária é feita na 12ª semana de gestação. Quando os dois embriões* parecem saudáveis, a escolha é aleatória. Com a ajuda do ultrassom, o médico localiza o embrião de mais fácil acesso e injeta cloreto de potássio na região que parece pulsar. O objetivo é atingir o coração. A morte é instantânea.

11 de agosto de 2011

As escolhas (estranhas) de Deus

Em Amadeus, Salieri não entendia por que Mozart - vulgar e infantil -
foi eleito canal da beleza e harmonia de Deus.
Neste Post d'A Católica, conheça essa e outras escolhas de Nosso Senhor.

(Imagem: Reprodução-Internet)

Vira e mexe a gente assiste à distância (ou mais perto do que gostaríamos) ao sucesso do outro. Não precisa ser necessariamente material, como um prêmio da loteria ou um carro novo. Pode ser um casamento. Uma aprovação no vestibular. Uma carta de direção. Uma gravidez. Ficamos entre o contentamento por sua conquista e o despeito. A incompreensão: "Por que tudo parece dar tão certo para ele, e não para mim?".

Quem de nós não passou - ou ainda passa - por isso?

Dói, especialmente, quando o outro, no nosso ponto de vista, "não merece" o sucesso ou a bênção que está recebendo. Por exemplo: uma garota que não se dedicou tanto quanto poderia aos estudos, que lia de vez em quando apenas, mas conquistou uma vaga num concurso público, enquanto você, que estudou dia e noite, perdeu festas e horas de sono, não. Vem a raiva: "Eu é quem deveria estar lá, não ela!".

E quanto às mulheres que engravidam de um filho atrás do outro, sem a mínima condição financeira nem psicológica de criá-los, deixando-os viver na rua e até mesmo abandonando recém-nascidos em caçambas de lixo? (Como vemos nos telejornais aqui no Brasil.) Enquanto outras, prósperas tanto material quanto emocionalmente, têm extrema dificuldade de engravidar, fazem tratamentos caros em clínicas de fertilização e às vezes... Nada. "Por que, meu Deus?", devem se perguntar.

É sobre isto que trata Amadeus (Estados Unidos, 1984): inveja e incompreensão. No começo desse maravilhoso longa-metragem, dirigido por Milos Forman, um menino - o italiano Antonio Salieri (1750-1825) - dirige uma oração fervorosa aos Céus, durante a Santa Missa:

Meu Deus, faça de mim um compositor famoso. Permita-me celebrar a Sua glória através da música... E ser celebrado. Faça-me famoso em todo o mundo. Faça-me imortal. Quando eu morrer, faça com que as pessoas me apreciem pelo que eu compus. Em retorno, eu Lhe darei minha decência, minha diligência, minha humildade em cada momento da minha vida. Amém.

Internauta, eu ainda não lhe contei: logo antes dessa cena, Antonio Salieri aparece bastante envelhecido, em um hospício, confessando-se com um sacerdote - confesso a você que essa é a minha passagem favorita de todo o filme. Justo aqui, a atuação de F. Murray Abraham como Salieri, com seu olhar e lábios encrespados que caracterizam um invejoso típico, já se mostrava digna do Oscar (o qual acabou ganhando).

Na verdade, o longa de Milos Forman acontece em torno desse momento: o roteiro se desdobra a partir do ponto de vista do velho Salieri ao longo da confissão que faz com o jovem padre.