26 de abril de 2023

Quem fica acanhado em pedir não recebe milagre

Tela: Christ and the pauper. Healing of the blind man
(2009), Andrey Mironov

Na última etapa da Sua viagem rumo a Jerusalém (onde sofreria a Paixão), ao chegar à cidade de Jericó, Jesus é chamado por um mendigo nestes termos: "Jesus, filho de Davi, tem piedade de mim!". Ante as interpelações daqueles que exigiam que se calasse, o mendigo insistia no apelo, gritando mais forte: "Filho de Davi, tem piedade de mim!".

Como no incidente com as criancinhas, os discípulos tentavam impedir uma pessoa "insignificante" de importunar seu Mestre. Jerome Kodell, em Comentário Bíblico (Edições Loyola, 2014), faz uma comparação. Nesse episódio, "a observação de que 'os que iam na frente' são os que repreendem o mendigo é advertência sutil aos chefes religiosos que menosprezam as necessidades dos indefesos". Mas, Jesus não deixa sem socorro os humildes que expressam sua necessidade de salvação.

Ainda de acordo com Jerome Kodell, cego como era, o mendigo no entanto exclama com discernimento inspirado, chamando Jesus pelo título messiânico de "filho de Davi".

Na obra Jesus - A Enciclopédia (Editora Vozes, 2020), Claude Tassin explica: "No século I, os ambientes populares esperavam sobretudo o Rei Messias, filho de Davi, que salva da opressão sociopolítica, dos demônios e das doenças. Os desafortunados invocam Jesus como 'Filho de Davi'. Antes de qualquer elaboração teológica desse título, eles sonham com Salomão, que nas lendas se tornou o santo patrono dos exorcistas e dos curandeiros".

O exegeta continua: "Do novo Davi esperava-se uma carreira conquistadora. Ora, Jesus não agiu nesse sentido e, à luz de Seus gestos, os evangelhos precisaram reconstituir um dossiê das 'obras de Cristo' que atestasse Sua identidade messiânica: 'Os cegos enxergam e os coxos andam, os leprosos são purificados e os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e a Boa-Nova é anunciada aos pobres'". Uma lista que ecoa promessas do livro de Isaías e milagres dos profetas Elias e Eliseu.

Quando enfim Jesus lhe pergunta: "Que queres que te faça?", o mendigo cego dá um passo além e identifica-O como "Senhor". É então que, em resposta a esse salto na fé, ele recebe a mensagem de libertação: "Vê! Tua fé te salvou". Presenciando isso, todos glorificam a Deus. Como Rinaldo Fabris observa em Os Evangelhos II (Edições Loyola, 2006), "a essa fé do homem curado, que prorrompe num canto de reconhecimento, associa-se, como numa liturgia comunitária, o coro de todo o povo".

John Dwight Pentecost, em As Palavras e As Obras de Jesus (Hagnos, 2022), extrapola na interpretação do episódio da cura do cego em Jericó: "Esse incidente foi planejado para ser uma lição aos Doze [apóstolos]. A nação de Israel estava cega espiritualmente e não reconheceu sua necessidade. Sendo esse o caso, seu povo não via razão para pedir ajuda a Cristo. Ele não poderia remover a cegueira de uma nação que não reconhecia sua necessidade e nem iria a Ele para que essa necessidade fosse satisfeita".

O professor completa: "Cristo ajudou aqueles que reconheceram sua necessidade e se voltaram para Ele em busca de ajuda. Essa foi a lição que esse incidente transmitiu". Em suma: só os humildes, que não se acanham em pedir pela própria salvação, são brindados com o milagre.

Licença Creative Commons
Atribuição: Ana Paula Camargo (acatolica.blogspot.com).
Este trabalho está protegido
por uma LICENÇA CREATIVE COMMONS.
Clique no Link para conhecê-la.