29 de abril de 2023

Um Deus que busca e dá pulinhos quando acha

Tela: Parable of the Lost Drachma
(1618), Domenico Fetti

Que católico nunca apelou pra São Longuinho, quando perdeu um objeto? São Longuinho, São Longuinho, fazei-me encontrar o que procuro e eu darei três pulinhos. E não é que a gente acha mesmo? Tanto alívio, tanta alegria por uma chave, uma carteira, um celular que estavam desaparecidos. Imagine, então, o coração de Deus quando Ele recupera para Si uma pessoa extraviada! É justamente esse o tema de fundo da parábola da dracma perdida ou da moeda reencontrada.

É preciso primeiro lembrar que Jesus contou essa história pra uma audiência formada por publicanos (coletores de impostos) e pecadores, mas também por fariseus e escribas devotos, que murmuravam por Ele se cercar de pessoas de "má vida". Como John Dwight Pentecost pontua em As Palavras e As Obras de Jesus (Hagnos, 2022): "No pensamento farisaico, Deus odiava os pecadores e por isso Se afastou deles. Visto que Cristo acolheu-os e até comeu com eles, os fariseus concluíram que Ele não poderia ser Deus".

Em Os Evangelhos II (Edições Loyola, 2006), Rinaldo Fabris explica:

A ortodoxia religiosa do ambiente de Jesus quer manter separadas duas categorias: os justos de um lado, os pecadores do outro. De fato, o cumprimento exato das normas jurídicas da Torá leva à "justiça", isto é, ao estado pelo qual o homem pode se apresentar com segurança perante Deus. Esse sistema religioso cria a classe dos "pecadores", a saber, das pessoas que não vivem conforme as prescrições da lei. O pecador compromete a aliança e a salvação do povo de Deus. O justo evitará todo contato com ele, para não se contaminar com seu estado de impureza.

Jesus pensa e se comporta de maneira diferente.

De acordo com o mesmo autor, Ele "anuncia a salvação de Deus oferecida aos pecadores, não porque eles tenham se tornado dignos dela conforme os critérios da teologia judaica, mas porque Deus Se solidariza com o excluído e o necessitado, cuida e vai em busca do perdido e faz festa para aquele que acha". Por isto, Jesus conta a parábola da moeda perdida: pra convidar os judeus que se viam como "justos" a entrar na lógica misericordiosa de Deus.

Nessa história, uma mulher que tinha dez dracmas perde uma e a busca diligentemente até encontrá-la.

Joachim Jeremias, em As Parábolas de Jesus (Paulus, 2007), diz que ela até acende uma lâmpada em pleno dia pra procurar a moeda, porque mora "numa casinha escura, que recebe luz pela porta baixa". Alfred Edersheim, citado em As Palavras e As Obras de Jesus, chama-a de "pobre camponesa" e descreve o lugar como "um casebre rústico de pau a pique, com um chão de terra forrado com junco e sem janelas".

Quanto ao dinheiro, Michel Gourgues observa em As Parábolas de Lucas (Edições Loyola, 2005): "O valor da dracma corresponde aproximadamente ao de um denário, ou seja, ao salário cotidiano de um trabalhador agrícola. Portanto, essa mulher não é rica e compreende-se tanto melhor o ardor que põe na busca". Talvez a dracma integrasse o dote entregue a ela por seus antepassados ou uma pequena poupança que fez.

Alfred Edersheim analisa: "A moeda, embora perdida e fora de uso, trazia a imagem do imperador e era intrinsecamente valiosa. Jesus quer que entendamos que a alma do homem perdido traz a imagem de Deus, por mais que esteja coberta com a ferrugem ou com a sujeira do pecado. É recuperável, embora, enquanto no estado pecaminoso e impenitente, esteja sem proveito para seu uso adequado e para o serviço para o qual Deus a destinou. O foco dessa parábola é a busca".

E a mulher, na procura, utiliza até uma vassoura pra fazer a dracma tinir no chão! Alfred Edersheim salienta: "O pecador é tão precioso aos olhos de Deus, que nenhum esforço é grande demais para recuperá-lo. Os detalhes da busca são muito bem ilustrados. Houve zelo, meticulosidade e persistência até que o resultado fosse obtido. A casa foi virada de cabeça para baixo até que a moeda fosse encontrada".

E, depois de achá-la, vem o júbilo. Grande demais para uma pessoa apenas e, assim, precisa ser compartilhado. Por isso, a mulher reúne amigas e vizinhas para regozijarem-se com ela.

Jerome Kodell, em Comentário Bíblico (Edições Loyola, 2014), reflete: "E as outras nove moedas - não são importantes também? Com certeza, mas a alegria do Reino foge das categorias da razão e dos bons negócios. O que era dado por perdido foi encontrado. É como uma nova vida, uma ressurreição: precisa ser celebrada". Rinaldo Fabris complementa: "A alegria e a festa de Deus está toda concentrada no acontecimento salvífico por excelência: o retorno ou conversão do pecador, a ponto de não haver mais lugar para a alegria em relação aos justos ou perfeitos".

Porém, esse autor questiona: pode haver um justo que não precise de conversão? De fato, até mesmo os piedosos e praticantes precisam de uma revolução religiosa que os leve a compreender o estilo de Deus, qual seja, o da misericórdia para com aqueles que eles julgam equivocados, pecadores e ímpios. Nesse sentido, o Senhor também almeja dar pulinhos pra São Longuinho, ao recuperar pra Si os que não se veem como extraviados...

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Atribuição: Ana Paula Camargo (acatolica.blogspot.com).
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