4 de fevereiro de 2011

Contra o medo... Dá-lhe São Brás!

Seu milagre mais marcante foi tirar uma espinha de peixe que "trancava"
a garganta de um menino. A espinha simboliza o medo que nos sufoca e estreita.

Schlamm-Assel-Fisch (1940), Paul Klee

Tornei-me devota do santo armênio, que viveu no século IV, há menos de um ano. Quando soube que era o "protetor da garganta contra qualquer mal", apeguei-me a ele com todo o fervor. É que meu Vovô Raul teve que se submeter a uma traqueostomia enquanto esteve internado em uma Unidade de Tratamento Intensivo (UTI), aqui em Belo Horizonte. Eu rogava a São Brás para que nenhuma infecção entrasse pelo seu pescoço.

Não adiantou.

Não. Não é que a traqueostomia agravasse o seu caso. Simplesmente, meu avô partiu. Fiquei para trás, enquanto ele seguia para o Céu. Para trás e com mais um santo a quem pedir intercessão: o 21º da minha longa lista de devoção (para entender a veneração dos católicos aos santos, leia aqui). Esse homem, São Brás, mártir que testemunhou com o sangue a fé em Cristo, foi lembrado e celebrado pela Igreja nessa quinta-feira, dia 3 de fevereiro.

Quem primeiro me chamou a atenção para ele foi o monge beneditino Anselm Grün, na surpreendente obra 50 Santos - que já mereceu uma Resenha d'A Católica. O título do capítulo que dedicou ao santo é: Brás - atravesse seu medo. A análise saborosa do religioso se deu a partir da legenda da espinha de peixe (o termo legenda consta na seção ABCatólica do Blog).

Little Girls with a Cod (Sem Data), Anna Ancher

Frei Jorge E. Hartmann OFM (Ordem dos Frades Menores) nos conta: "... [um dia, foi] procurado por uma mãe aflita que lhe implorava salvar seu filho que estava por morrer sufocado por causa de uma espinha de peixe que ficara trancada na garganta. São Brás, sempre solícito, impôs-lhe as mãos, traçou o sinal da cruz e fez uma oração salvando-o da morte".

Por isso, sua imagem mais popular (pelo menos, nas lojas católicas aqui na capital de Minas, estado brasileiro onde nasci e vivo) traz uma mulher de joelhos com uma criança no colo, diante do santo, o qual tem duas velas acesas na mão esquerda, enquanto, com a direita levemente erguida, abençoa o menino.

Grün faz um estudo interessantíssimo, que começa assim: "A garganta é certamente uma das regiões mais sensíveis. (...) Muitas vezes ficamos resfriados, porque não experimentamos calor e amor suficientes. Ou é o medo que nos estrangula. (...) Outras pessoas 'engoliram muito sapo' - agora têm um nó de medo, mágoa e ira na garganta que as impede de respirar livremente". Mais à frente:

A aflição que hoje poderia ser da competência de Brás é o medo. O medo nos estreita. A garganta apertada é a imagem corpórea da estreiteza do medo. (...) Uma tem medo do fracasso, outra do julgamento e da rejeição. Outras têm medo de doenças, da morte (...). Brás não pode simplesmente apagar esses medos.

Mas, na medida em que contemplamos sua legenda (...), podemos perceber maneiras de lidar com nosso medo. A espinha de peixe presa na garganta é uma imagem perfeita do medo. Há algo empacado em nós. Quanto mais mexemos nele, menos se movimenta. Ao contrário, só nos machuca.

(...) Devemos nos reconciliar com a espinha parada em nós, com o medo que nos domina. Se falamos com o medo, o que está em volta dele tende a se desprender. E quanto mais soltamos mais facilmente a espinha pode se desgrudar e ir embora.

Fotografia de Anna Cervova

E quanto às velas na imagem do santo? Frei Jorge E. Hartmann OFM relata:

Na memória de São Brás (...), a liturgia [rito da Igreja] apresenta-nos uma cerimônia incomum, isto é, o sacerdote cruza duas velas bentas e aproxima-as ao pescoço dos fiéis, invocando a proteção do Santo pronunciando estas palavras: "Pelas orações e méritos de São Brás, bispo e mártir, Deus te livre do mal da garganta e de todos os outros males, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo".

Grün esclarece, brilhantemente, o significado desse ritual: "Nas velas, a atenção amorosa de Deus se apresenta justamente onde você se contrai. (...) O calor do amor dissolve toda contração. Quem tem a experiência de ser aceito e afagado onde se sente espremido vê toda estreiteza se dissolver". No final do capítulo dedicado a São Brás, o monge nos dá esta Grande Lição:

Seu medo também pode existir. Mas ele é tocado pelo amor de Deus, que o transforma e o dissolve.

Aprendemos juntos sobre a famosa legenda da espinha de peixe. Contudo, até agora não falamos sobre a vida do santo propriamente dita, certo? I saved the best for last - como se diz em inglês.

Mario Sgarbossa e Luigi Giovannini no excelente Um Santo para Cada Dia (Paulus, 1996) observam: "É meio incerta a existência histórica de Brás, bispo de Sebaste, na Armênia". Eles sustentam: "... o calendário litúrgico conservou a memória do santo neste dia [3 de fevereiro], embora haja muita lenda a seu respeito". Frei Jorge E. Hartmann OFM afirma: "... as notícias históricas sobre São Brás são escassas".

Saint Brás (16th century), Master of the Saint Bras

O que existe (e que A Católica encontrou) é isto: conforme dito acima, ele viveu em Sebaste, na Armênia, continente europeu, no século IV. Foi um médico querido por sua comunidade, que o proclamou bispo.

Nota: hoje, quem escolhe e nomeia um bispo é o Papa, no caso, Bento XVI. Antigamente, não era dessa forma. Na Idade Média, por exemplo, "bispos e abades [chefes de uma abadia, mosteiro] eram nomeados e, então, empossados ('investidos') em seus ministérios por governantes temporais. (...) A prática da interferência leiga [não-religiosa] em nomeações eclesiásticas continuou até no século XX (...)". (Os Papas - Os Pontífices: de São Pedro a João Paulo II, Edições Loyola, 2004)

Retomando: Licínio, "colega do imperador Constantino", o qual esteve à frente do Império Romano entre os anos de 313 e 324, iniciou uma perseguição aos cristãos (para entender como e por quê isso ocorria, veja o Post sobre Santa Luzia). Segundo Frei Jorge E. Hartmann OFM, Brás retirou-se "para um lugar deserto, vivendo numa gruta, de onde procurava orientar e zelar pelo rebanho que lhe fora confiado".

É aí que entra um dos "muitos particulares" que enfeitam a lenda do santo, mencionados por Sgarbossa e Giovannini: o bispo viveria "cercado de animais da floresta, que eram amigos especiais trazendo-lhe até comida". Frei Jorge prossegue: "Descoberto por caçadores, foi denunciado e preso pelos soldados do imperador. (...) Na prisão não deixou de exercer o quanto pôde sua missão de pastor e guia do rebanho perseguido...".

Brás acabou condenado "por não querer renegar Cristo e sacrificar aos ídolos. Teve suas carnes arrancadas com pentes de ferro. Suportou tantos suplícios até que lhe cortaram a cabeça" (Um Santo para cada Dia). Isso ocorreu no ano de 316. Não se sabe se o milagre da espinha de peixe, narrado no início deste Post, ocorreu enquanto ainda estava na prisão ou se durante o percurso até o seu martírio.

Fico por aqui, internauta. Espero mesmo que tenha gostado de conhecer um pouco mais a vida do santo da Armênia! Que ele abençoe o que entra e, sobretudo, o que sai da nossa garganta, nas nossas conversas, pela nossa voz.

São Brás, Rogai por Nós!

Fotografia de 1953, por Gustav Köhler - German Federal Archive, Bild 183-18564-0002

Ó, São Brás, que recebestes de Deus o poder de proteger as pessoas
contra as doenças da garganta e outros males,
afastai de mim a doença que me aflige,
conservai minha garganta sã e perfeita.

Eu vos prometo, São Brás,
que minha fala será sempre de verdade e não de mentira,
de justiça e não de calúnia,
de bondade e não de aspereza,
de compreensão e não de intransigência,
de perdão e não de condenação...
de calma e não de irritação,
de desapego e não de egoísmo...
de ânimo e não de derrotismo,
de conformidade e não de lamúrias.

De amor e não de ódio.
De alegria e não de tristeza.
De fé e não de descrença.
De esperança e não de desespero.

São Brás, conservai minha garganta livre das doenças,
a fim de que minhas palavras possam louvar a Deus, meu Criador,
e agradecer a vós, meu protetor. Amém.

(A oração está em Os Cinco Minutos dos Santos, Editora Ave-Maria, 2006.)


~Ana Paula~A Católica
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