6 de março de 2011

Quem nasce no Vaticano é...

Até hoje, ninguém nasceu em território papal.
Mas, os critérios que definem quem é cidadão ou nacional deste país -
o menor do mundo - mudaram. Confira neste Post d'A Católica!

Bandeira do Estado da Cidade do Vaticano - Domínio Público

Como o Brasil de Dilma Rousseff, o Egito (que já foi) de Hosni Mubarak e a Itália do polêmico Silvio Berlusconi, o Vaticano de Bento XVI também é um Estado. Tem um território, de 0,44 quilômetros quadrados, uma população, de cerca de 800 pessoas, e um governo, personificado no "Sumo Pontífice, Soberano do Estado da Cidade do Vaticano, [que] tem a plenitude dos poderes legislativo, executivo e judicário", conforme o Artigo 1º da Nova Lei Fundamental de 26 de Novembro de 2000.

Como Estado, entre as atribuições de seu governo, está conferir a cidadania ou a nacionalidade vaticana para parte de sua população.

Estado da Cidade do Vaticano - Washington, D.C.: Central Intelligence Agency
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Esclarecimento: segundo Nguyen Quoc Dinh, Patrick Daillier e Alain Pellet, em Direito Internacional Público (Fundação Calouste Gulbenkian, 2003), enquanto elemento constitutivo do Estado, "a população é entendida sobretudo como a massa de indivíduos ligados de maneira estável ao Estado por um vínculo jurídico, o vínculo da nacionalidade".

Contudo, os três juristas acentuam: a população não se restringe aos nacionais, compreendendo também todos os que, "por qualquer relação jurídica diferente da nacionalidade, dependem de um Estado". Dessa forma, as 800 pessoas ligadas ao Estado da Cidade do Vaticano constituem a sua população, porém nem todas são seus nacionais ou têm a cidadania vaticana. E quem a detém?

É precisamente da resposta a essa pergunta que trata o artigo da agência de notícias internacional Zenit, publicado no início deste mês de março: Entra em Vigor a Nova Lei de Cidadania do Vaticano.

De acordo com o texto, "cidadãos do Vaticano são o Papa, os cardeais que residem no Vaticano ou em Roma [Itália], os membros do Corpo Diplomático vaticano que estão em funções e outros responsáveis vaticanos em razão do cargo ou do serviço que desempenham. A cidadania não é obtida por nascimento, mas por concessão".

Ou seja, internauta d'A Católica: diferentemente de grande parte dos países do mundo, nos quais a nacionalidade é atribuída em razão do lugar de nascimento (por exemplo: quem nasce no Brasil é brasileiro) ou da filiação (descendente de italiano, italiano é), no caso do Vaticano, conforme Jose Puente Egido, em Personalidad Internacional de la Ciudad del Vaticano (Instituto Francisco de Vitória, 1965): "é precisamente a combinação destes dois critérios: função e residência na Cidade do Vaticano (para os cardeais, Roma) que resulta na outorga da cidadania vaticana".

Light streaming into St Peter's Basillica, Vatican City - Fotografia de James Bromberger (Jeb)

O que mudou com a nova lei - promulgada pelo Papa Bento XVI no dia 22 de fevereiro?

Primeiro: segundo o artigo da agência de notícias, agora foi tipificada "a figura do residente, quer dizer, de quem vive no Vaticano sem ter a cidadania".

O presidente do Comitê de redação da lei, Dom Giorgio Corbellini, citado no texto da Zenit, elucida: "[o residente] adquiriu cada vez maior importância na realidade vaticana; no transcurso dos anos, muitas pessoas habitantes no Estado preferiram, ainda cumprindo os requisitos, não assumir a condição de cidadão, que na lei de 1929 era considerada a situação normal dos que viviam nele".

Segundo: quando Jose Puente Egido escreveu Personalidad Internacional de la Ciudad del Vaticano, a falta de um destes critérios - função ou residência - ocasionava a perda da cidadania vaticana. De acordo com o autor: "Não se é cidadão vaticano pelo nascimento, senão por uma função vinculada a uma residência no território". A partir de agora, deste ano, há "o reconhecimento da cidadania aos núncios e diplomatas enquanto exercem o cargo, fato que não constava na lei anterior".

Diante de tudo isso, e em síntese, "o Vaticano tem atualmente (...) 572 cidadãos, dos quais habitam no território apenas cerca de 220". "A razão da 'diáspora'", o artigo da agência Zenit explica, "é que grande parte dos cidadãos vaticanos são núncios e diplomatas". Nota: para definição de núncio, consulte a página ABCatólica.

Chocado com a quantidade de cidadãos ou nacionais vaticanos? Bem, internauta d'A Católica, o número 572 frente aos 190.732.694 brasileiros no meu país é realmente pequeno. Entretanto, não subestime a soberania do Vaticano. Em Direito Internacional Público, tamanho não é documento. E as cerca de 800 pessoas que formam a população vaticana (entre as quais estão os 572 cidadãos ou nacionais) são importantíssimas para conferir status de Estado ao Vaticano. Segundo Francisco Rezek, em Direito Internacional Público: curso complementar (Saraiva, 2005):

Em circunstâncias excepcionais e transitórias, pode faltar ao Estado o elemento governo – (...) nos períodos anárquicos – e (...) até mesmo a disponibilidade efetiva do seu território ou o efetivo controle dessa base por seu governo legítimo. O elemento humano é, em verdade, o único que se supõe imune a qualquer eclipse e cuja existência ininterrupta responde, mais que a do próprio elemento territorial, pelo princípio da continuidade do Estado.

Apesar de ser soberano de um território diminuto, cuja população é ínfima e peculiar (afinal, ninguém nasce no Vaticano: o cidadão ou nacional é sobretudo um funcionário), Bento XVI merece - e recebe - todas as honras de um autêntico Chefe de Estado. Não se esquecendo de que a presença dos católicos no mundo, os quais o Sumo Pontífice lidera espiritualmente, corresponde a 1 bilhão e 181 milhões de fiéis.

E viva o Papa! Saúde e Paz!!

St. Peter's Basilica at Early Morning - Fotografia de Andreas Tille

P.S. Conforme Jose Puente Egido sublinha a respeito dos Tratados de Latrão [que criaram o Estado da Cidade do Vaticano em 11 de fevereiro de 1929], especialmente em seu Artigo 9º, "não se estabeleceu uma diferença entre cidadania e nacionalidade do ponto de vista estritamente jurídico; o tratado utiliza ambos [os termos] como sinônimos".

P.S.2 Para ler a notícia da agência Zenit destrinçada neste Post, acesse aqui.


~Ana Paula~A Católica
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