30 de março de 2011

Crentes e Não-Crentes: Uma Chance de Diálogo

"Os adoradores do Deus misterioso não se sentem, de fato,
longe daqueles que buscam verdadeiramente um Deus desconhecido."
(Padre Federico Lombardi, SJ)

Neste Post, o Átrio dos Gentios: espaço para diálogo entre crentes e ateus

Creation of the Sun and Moon, face detail of God (1511), Michelangelo Buonarroti

Quando se cresce em um lar cristão, católico, é natural crer em Deus, em Seu Filho, Jesus Cristo, no Espírito Santo, em Nossa Senhora, em São José e tantos, tantos outros santos. Todos existem. E ponto. Questionar se Nosso Senhor encarnou ou não, viveu na Terra ou não, é o mesmo que perguntar: "Tem um céu sobre nós? Ele é azul-claro de dia e azul-marinho à noite, salpicado de estrelas?" Resposta: "Sim". E ponto.

Imagem de Vera Kratochvil

Acontece que o que é tão evidente e irrefutável para nós, cristãos e católicos, simplesmente não o é para uma parcela especial da humanidade. Essas pessoas são chamadas de ateus: "aqueles que não creem na existência de Deus". Algumas vezes, também são denominadas de agnósticos, ou seja, partidários do agnosticismo: "doutrina que declara o absoluto ou as questões metafísicas inacessíveis ao espírito humano, por não serem passíveis de análise pela razão".

E veja só que bonito: em vez de favorecer uma espécie de "Cortina de Ferro" entre os crentes e os não-crentes, o Vaticano criou um espaço de contato entre os dois grupos: o Átrio dos Gentios. Conforme soube pela agência de notícias internacional Zenit, trata-se de "um espaço (não físico) para o diálogo entre crentes e ateus, promovido pelo Conselho Pontifício para a Cultura, por sugestão de Bento XVI".

A primeiro reunião ocorreu no dia 12 de fevereiro deste ano, no auditório da Universidade de Bolonha (Itália) - "a mais antiga do mundo em funcionamento ininterrupto". Nota: 1.500 pessoas lotaram o local. A Zenit destacou o discurso do cardeal Gianfranco Ravasi, presidente do Conselho Pontifício para a Cultura, que abordou o pensamento do escritor e filósofo romeno Emil Cioran (1911-1995), o qual "se considerava da 'raça dos ateus'". Segundo a agência de notícias, o cardeal relatou:

Cioran se declarava ateu e agnóstico e, no entanto, chegou a sugerir aos teólogos um caminho "estético" particular para provar a existência de Deus. Ele escreveu: "Quando vocês ouvem Bach, veem o nascimento de Deus... Depois de um oratório, uma cantata ou uma Paixão, Deus deve existir... E pensar que tantos teólogos e filósofos desperdiçaram dias e noites à procura de provas da existência de Deus, esquecendo-se da única!".

Internauta d'A Católica: que bonita, essa colocação de Emil Cioran!

Sua reflexão, embora proviesse de um ateu, fundou uma ponte que me aproximou dele, do seu coração. A beleza de uma obra de arte é, decididamente, uma manifestação do divino. Sempre acreditei que Bach, Beethoven e até os Beatles ou poetas como meus conterrâneos das Minas Gerais (Brasil) Carlos Drummond de Andrade e Adélia Prado não elabora(va)m suas obras sozinhos. Sempre há o dedo de Deus.

Detail of the en Creation of Adam (1510), Michelangelo Buonarroti

O artigo da Zenit também citou Dra. Gaia Zanini, assistente da iniciativa do Vaticano, que declarou: "Hoje, mais que nunca, a Igreja se sente chamada a uma dimensão de confronto, de abertura, de contínua revitalização dos seus fundamentos, precisamente por meio deste recurso inesgotável que é o diálogo". De acordo com ela, para que seja frutífero, "não é necessário somente encontrar a linguagem adequada e a profundidade dos argumentos em si, mas também a 'fidelidade às próprias posturas, a continuidade e a renovação'".

Nos dias 24 e 25 de março, ocorreu o mais recente encontro do Átrio dos Gentios - desta vez, em Paris, na França. Conforme novo artigo da agência de notícias, o Papa gravou uma mensagem em vídeo:

Primeiro, constatou que os não-crentes interpelam os crentes, "exigindo deles, em especial, o testemunho de uma vida que seja consistente com aquilo que professam e rejeitando qualquer desvio da religião que a torne desumana", segundo afirmou o Pontífice. E então ele disse que os crentes querem dizer a seus amigos não-crentes que o "tesouro" que carregam dentro de si "merece ser compartilhado, merece uma pergunta, merece uma reflexão sobre ele".

Segundo Padre Federico Lombardi, SJ (sigla em latim de Companhia de Jesus), diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, "o Papa Bento XVI disse, desde o primeiro dia do seu pontificado, que a questão de Deus é a primeira de todas. E que isso diz respeito a todos, sem distinções nem fronteiras". Dessa forma, suas palavras no vídeo foram "um apelo veemente à busca comum do caminho rumo ao Absoluto, sem medos nem desconfianças mútuas". Para o padre, o Átrio dos Gentios "é um excelente ponto de partida para esse caminho".

Fotografia de Peter Griffin

Gosto disso. Gosto de imaginar que a Igreja Católica estende a mão para quem pensa diferente, em vez de criticar, condenar e excluir. Em vez de "virar as costas".

Para desenvolver esse diálogo, que é um "recurso inesgotável" para a "contínua revitalização dos seus fundamentos", em linha com o que a Dra. Gaia Zanini ponderou, a Igreja não tem que abrir mão das "próprias posturas". Para quebrar barreiras, então, é possível partir de pontos de contato. Por exemplo: de acordo com Padre Federico Lombardi, SJ, "o Deus conhecido na fé é sempre um Deus misterioso, e seus adoradores não se sentem, de fato, longe daqueles que buscam verdadeiramente um Deus desconhecido".

Fico por aqui, saudando e parabenizando o Sumo Pontífice pela Brilhante Iniciativa do Átrio dos Gentios e torcendo para que Todos os Fiéis alinhem-se a esta proposta de aproximação. Saúde e Paz!!

P.S. Para saber mais:
1) "Átrio dos Gentios" será levado para outras cidades do mundo;
2) Um dia eles hão de voltar, artigo de Dom Benedicto de Ulhoa Vieira;
3) Site do Átrio dos Gentios - em italiano, inglês, francês e espanhol.


~Ana Paula~A Católica
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