10 de novembro de 2010

Deus gosta dos pequenos. E ponto.

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Se não entendermos que grandezas nada significam para Deus,
continuaremos a valorizar as coisas erradas e a achar que seguimos a Cristo,
quando, na verdade, estamos mais para o "jovem rico" tratado nos evangelhos

No 1º semestre deste ano, participei do Curso de Bíblia da minha paróquia. Numa das aulas, em vez de se concentrarem no tema - BÍBLIA -, alguns alunos (não me recordo como nem por quê) começaram a levantar uma polêmica sobre a "carreira eclesiástica". Um dizia que conhecia um padre bom, mas que jamais chegou a bispo; outro conjeturava sobre um sacerdote com menos mérito, e que, não só se tornou bispo, como estava em vias de virar cardeal.

Aquela conversa, totalmente desviada da finalidade do curso e permeada por tópicos tão mundanos quanto comendas, prêmios, promoções e méritos, fez o meu sangue ferver, ferver, ferver a ponto de quase coagular e me deixar estirada, dura e catatônica. No chão.

Tomei a palavra (antes de terminar estirada no chão frio) e comecei dizendo assim: "Deus deve estar morrendo de rir dessa conversa".

Todo mundo torceu o pescoço para me olhar. "Nós sabemos que 'ascensão eclesiástica' é importante para os homens; não para Deus. Um padre que há 50 anos serve a mesma paróquia pode ser mais agradável a Deus, pode cumprir melhor a sua missão, do que um que chegou a cardeal e mora lá no Vaticano. Deus não olha diplomas. Deus olha o coração".

A conversa acabou ali. Senti que o excelente e talentoso Professor Gabriel, de quem gosto muito, não gostou, porém, da minha intervenção. Ora, bolas! Tive que participar da discussão. O trem chegou a um nível, que me era questão de vida ou morte dar um basta àquilo, àquela conversa sem propósito aceitável de promoção dentro da Igreja.

A gente lê, lê e lê a Bíblia, onde a verdade está escancarada pra todo mundo ler e reler que Deus elege os fracos, os fracassados, os pecadores, os pequenos, que Jesus Cristo escolheu como apóstolos um bando de ignorantes, porém humildes e tementes a Deus, desprezando os "benquistos" à sociedade, optando pelos pobres, excluídos, prostitutas arrependidas e leprosos...

... E, mesmo assim, mesmo sabendo disso tudo de cor e salteado, desde quando éramos crianças que frequentavam o catecismo, lamentamos que um padre de uma paróquia lá onde Judas perdeu as botas, lá de uma cidadezinha no interior das minhas Minas Gerais, está "sendo injustiçado" só por não ter recebido a solene promoção e a grande honra de se tornar bispo? Faça-me o favor!

Quando é que a gente vai pôr em prática esta passagem valiosíssima do Evangelho de São Lucas, chave para entendermos o ministério de Jesus Cristo, Nosso Redentor, a qual já mencionei em um Post d'A Católica? A saber:

Jesus disse-lhes: "Vós procurais parecer justos aos olhos dos homens, mas Deus vos conhece os corações; pois o que é elevado aos olhos dos homens é abominável aos olhos de Deus” (Lc 16, 15).

Fotografia de Robert Kraft

O católico que se preze deve se esforçar por virar a si mesmo "de cabeça para baixo". A partir do momento em que a nossa conversão se inicia (porque sabemos que ela nunca termina), nós temos que exercitar nossos olhos, nossa mente e o nosso coração para ver, pensar e sentir tudo, todos os aspectos da vida, de UM JEITO DIFERENTE. Não dá para nos chamarmos de autênticos cristãos e católicos se só valorizamos, respeitamos, admiramos e tratamos bem aqueles que tiveram "grandes conquistas materiais ou profissionais".

Se Jesus Cristo, durante os cerca de três anos da Sua vida pública, na qual pregou e realizou grandes milagres (aliás, grandes milagres é redundância: não existe milagre pequeno), bem, se durante o tempo em que anunciou o Reino de Deus, Ele privilegiou os excluídos e tidos como "menores", não há como alguém que se propõe a ser o Seu discípulo, a segui-Lo, fazer diferente.

Se eu reservo o meu melhor sorriso, compro os melhores presentes e escolho os mais bonitos cartões de Natal para dar àqueles que eu quero ter perto de mim - afinal, são tão "ricos", tão "bem-sucedidos", que não posso me afastar deles nem perder a sua amizade -, bem, se eu (ao contrário do Mestre), opto pelos que julgo "os melhores", como posso agarrar a Bíblia contra o meu peito, pendurar um crucifixo na parede ou no pescoço, falar "Aleluia" e dizer com a cara mais limpa (e linda) do mundo: "Sou católica"?

Minha opção de vida - acúmulo de bens materiais, amizades que podem me dar algo em troca, roupas caras só para ostentação - contradiz o que um discípulo de Jesus Cristo deve ser e fazer. Se a minha vida não é reflexo daquilo em que eu acredito, de duas uma: ou eu enlouqueço, porque não há quem aguente uma vida de incoerência (o resultado só pode ser um: sensação de vazio tremendo e depressão), ou eu assumo um dos lados, quais sejam, torno-me uma autêntica cristã e católica ou assumo o meu materialismo.

Padre Paulo Ricardo - e eu também já mencionei isto em outro Post d'A Católica - afirmou certa vez em um dos excelentes acampamentos da comunidade Canção Nova que o problema da Igreja Católica Apostólica Romana não é a "fuga de fiéis", mas exatamente o contrário: o excesso de gente que se diz católica, mas não age como tal. Foi ovacionado pela audiência.

É duro, é duro para mim também, acredite: a Igreja Católica é 8 ou 80. Ou você a abraça com tudo o que ela tem e propõe como modo de vida ou a rejeita. Não dá para aceitá-la em fatias: "Até aqui eu sou católica, quanto àquela norma ali, não dá para mim; aquilo, eu já não faço...". Não existe isso.

Jesus Cristo foi claro, translúcido. Melhor explicação sobre o que implica segui-Lo, impossível. É só acompanhar esta passagem do Evangelho de São Marcos (que também consta nos Evangelhos de São Mateus e de São Lucas). É longa, eu sei, mas vale a pena refletir atentamente sobre ela:

Tendo ele saído para se pôr a caminho, veio alguém correndo e, dobrando os joelhos diante dele, suplicou-lhe: "Bom Mestre, que farei para alcançara vida eterna?". Jesus disse-lhe: "Por que me chamas bom? Só Deus é bom. Conheces os mandamentos: não mates; não cometas adultério; não furtes; não digas falso testemunho; não cometas fraudes; honra pai e mãe". Ele respondeu-lhe: "Mestre, tudo isto tenho observado desde a minha mocidade". Jesus fixou nele o olhar, amou-o e disse-lhe: "Uma só coisa te falta; vai, vende tudo o que tens e dá-o aos pobres e terás um tesouro no céu. Depois, vem e segue-me". Ele entristeceu-se com estas palavras e foi-se todo abatido, porque possuía muitos bens.

E, olhando Jesus em derredor, disse a seus discípulos: "Quão dificilmente entrarão no Reino de Deus os ricos!". Os discípulos ficaram assombrados com suas palavras. Mas Jesus replicou: "Filhinhos, quão difícil é entrarem no Reino de Deus os que põem a sua confiança nas riquezas! É mais fácil passar o camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar o rico no Reino de Deus". Eles ainda mais se admiravam, dizendo a si próprios: "Quem pode então salvar-se?". Olhando Jesus para eles, disse: "Aos homens isto é impossível, mas não a Deus; pois a Deus tudo é possível".

Pedro começou a dizer-lhe: "Eis que deixamos tudo e te seguimos". Respondeu-lhe Jesus. "Em verdade vos digo: ninguém há que tenha deixado casa ou irmãos, ou irmãs, ou pai, ou mãe, ou filhos, ou terras por causa de mim e por causa do Evangelho que não receba, já neste século, cem vezes mais casas, irmãos, irmãs, mães, filhos e terras, com perseguições e no século vindouro a vida eterna. Muitos dos primeiros serão os últimos, e dos últimos serão os primeiros" (Mc 10, 17-31).

Voltando àquela aula de Bíblia, que mencionei no início deste Post. Meus caríssimos colegas - ou ao menos uma parte deles - usavam os parâmetros deste mundo, as perspectivas mundanas, para avaliar o que seria um padre "justamente reconhecido e bem-sucedido" na vida eclesiástica.

Aqueles colegas - na maioria, homens acima dos cinquenta anos de idade - não entenderam, e muitos de nós também não entendem, que quando Jesus nos propõe DEIXAR TUDO para segui-Lo, Ele não pede necessariamente a nossa miséria material. MAS, o nosso despojamento dos valores mundanos. O Mestre nos propõe a abrir mão daquilo que entendemos como importante ou exitoso. Ele nos pede um novo olhar e, consequentemente, um novo proceder.

Aos olhos de Cristo, uma formiguinha operária que humilde e alegremente cumpre o seu papel pode ser mais digna do que o nobre leão, cheio de condecorações e emblemas, para merecer participar do banquete no Reino dos Céus. (Nada impede que o leão também participe, desde que não seja soberbo.)

E então? Você, que se diz católico apostólico e romano, está mais para a formiguinha humilde ou para o leão orgulhoso? Está em tempo de decidirmos se o nosso SIM para seguir o Messias foi para valer mesmo. Saúde e Paz!!


Fotografia da formiga, por Leandro Gomes Moreira

~Ana Paula~A Católica
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