6 de maio de 2011

Sim, irmã: eu estou envelhecendo

Uma crônica sobre um medo que muitos têm: o de ficar velho.
Qual a razão disso? Por que há tantos tratamentos para evitar
o inevitável: o passar do tempo? Confira aqui as reflexões d'A Católica

Fotografia de Anne Jimenes

Não era minha intenção escrever este Post. Estava quieta no meu canto, pensando e lidando com assuntos da Igreja. Católica. Teologia, cristianismo, teorias e, principalmente, prática das teorias. Então, um olhar científico, intrusivo e acusador da minha irmã, Andréa Cristina, despertou o meu pasmo. Ela fixou os olhos sobre o alto da minha cabeça, mais exatamente no rumo da testa, e disse (entre incomodada e indignada): "Nossa, quanto fio branco! Você tem que tirar. Tem que pintar o cabelo".

Não estou exagerando, internauta d'A Católica: o olhar atrevido e invasivo da minha irmã e a sua condenação me lembraram o que as pessoas faziam, anos e anos atrás, com as mulheres que saíam à rua com batom vermelho, saia curta e cigarro entre os dedos.

Sim, acredite.

Houve um tempo em que uma mulher com batom vermelho, saia curta e cigarro na mão - não necessariamente as três coisas juntas - merecia os olhares reprovadores de (quase) todo mundo: ela era confundida com uma prostituta. Afinal, a mulher "honesta" não podia se vestir, se comportar nem muito menos aparecer em público assim. Li a respeito disso, quando me empenhei em um dos trabalhos que fiz no meu curso de Comunicação Social-Jornalismo.

Pois hoje em dia, já na segunda década do século XXI, ai da mulher que ousa deixar os cabelos brancos ou as rugas à mostra! Isso, para não falar daquelas que estão (bem) acima do peso. É como se cometessem um crime, um atentado à moral e até à dignidade da espécie humana.

Fotografia de Petr Kratochvil

Fotografia de Christopher Walker from Krakow, Poland

O irônico é que propalam por aí, especialmente através da imprensa, que nunca estivemos "tão livres", que cada qual é "livre" para viver do jeito que bem entender, que (quase) não existem mais as amarras da estranheza no que se refere à moda, ao comportamento. Mentira. Continuamos todos seguindo regras (ora visíveis e conhecidas, ora subliminares ou mesmo secretas) que decidem quem está bem e quem está mal. Quem age de modo a despertar admiração e quem merece a nossa reprovação.

A velhice, caro internauta, é reprovável. Está proibida. Quaisquer sinais dela, também.

Já ouviu falar de "linhas de expressão"? São aquelas marcas leves no nosso rosto, geralmente próximas aos olhos e ao redor da nossa boca. Até elas são malvistas. Devem ser evitadas, escondidas, rejeitadas. Eliminadas a botox e até a fogo, se preciso for. Quem aparenta a idade que tem ou (o que é pior) quem aparenta bem mais do que a idade que tem está errado. É digno de pena. De crítica.

Minha intenção não é defender os idosos. Não chego a tanto. Todos devem ser tratados com respeito e carinho: crianças, adolescentes, adultos e... Idosos. Meu objetivo é, digamos, mais sutil. Quero defender o direito de envelhecer. De ficar velho. E de parecer velho. Eu tenho esse direito. Sorry.

Ante a perplexidade e a irritação da minha irmã com meus (ainda poucos) fios brancos, comecei a filosofar comigo mesma: por que os sinais da passagem do tempo no nosso corpo chocam tanto? Por que merecem tanta censura? Por que as empresas de cosméticos reservam parte de seus anúncios comerciais para divulgar produtos "anti-idade"? Cremes e cremes para cada centímetro do rosto e até do pescoço, a fim de (tentar) retardar o surgimento das rugas, das muxibas?

Fotografia de Nisheedhi Adukuri

Fotografia de Zack Clark

No final, inferi uma certa nostalgia na fala impertinente da minha irmã.

Meus fios brancos berram para ela: "O tempo está passando, Andréa Cristina. Nem sua irmã Ana Paula nem você mesma são mais 'meninas'. As duas 'menininhas' do Papai Tuti e da Mamãe Gali. Estão ficando velhas. Inevitavelmente mais velhas. Duas balzaquianas a caminho da meia idade...". É o preço que se paga por continuar vivo: envelhecer. E admito que venho, devagarinho, me convencendo e me preparando para pagar cada tostão que o passar dos anos me cobrar.

A propósito. Lembrei-me de outro trabalho que fiz no curso de Comunicação Social-Jornalismo.

O professor da disciplina de Mídia Eletrônica ou Mídia em Internet (se não me engano) pediu que desenvolvêssemos um site sobre algum medo humano. Recordo que muitos colegas escolheram temas, como: insetos nojentos e aranhas; a morte; avião e altura; lugares fechados; ladrões e violência... Moreira, meu colega de Cabo Verde (na África), e eu formamos uma dupla e optamos pelo Medo de Envelhecer.

Pegamos a imagem de uma bela estátua do deus grego Hermes - filho e mensageiro de Zeus, protetor dos viajantes e comerciantes - e fizemos assim: para cada parte do corpo dele, que o internauta passasse o mouse e clicasse, apareceria uma doença relacionada. Doenças que muitas pessoas adquirem com a idade. Por exemplo: o mouse nos olhos mostraria um Link sobre a vista cansada ou a cegueira; na cabeça, para o mal de Alzheimer; nas pernas, para a artrite e por aí vai... O professor gostou da ideia.

Enfim: precisamos nos (re)educar e educar nossos filhos para aceitarem o passar do tempo. Não sustento que paremos de pintar os cabelos nem que deixemos de usar os cremes e cremes para "conservar" a boa aparência da nossa pele. Só acho exagero o pânico em que ficamos ao encarar a escolha de alguém de deixar as marcas dos anos flagrantes nos cabelos ou no rosto.

Você tem o direito de fazer o possível e o impossível para maquiar a sua idade. E eu tenho o meu de deixar os sinais da maturidade do meu corpo gritarem ou, pelo menos, falarem um pouquinho mais alto em mim. Sinto muito, se não gosta do que vê. Se realmente não aprova, por gentileza, dome a sua aversão. Não seja indelicado. Este deve ser um mundo com lugar Para Todos, o que inclui o óbvio: a velhice. Ela existe e é teimosa: quer aparecer. O que faço é apenas deixar isso acontecer. Naturalmente.

Fotografia de Petr Kratochvil

Fotografia de David et Magalie from Vancouver, Canada


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