27 de maio de 2011

Pippo Buono: o santo que dava risadas

Filipe Néri ria de quem se achava "um cristão exemplar"
e ria muito de si mesmo também. É dele a frase:
"O servo de Deus deve estar sempre alegre". Um apelo para todos nós

(Fotografia de zitona qatar from doha, qatar)

Maio de 1954 - Fotografia de Roger e Renate Rössing - Fonte: Deutsche Fotothek‎

"Quem exibe a sua religiosidade não é religioso."
(São Filipe Néri)

Não sei quanto a você. De vez em quando, eu trombo na vida - e isso inclui a Blogosfera ou Efigênia, o mundo dos Blogs - com gente que acha que ser "um bom católico" consiste em assistir à Santa Missa em latim (verdade, não estou inventando), encobrir as pernas, falar mal do carnaval, assegurar que as outras religiões cristãs não prestam e atacar o movimento da Renovação Carismática Católica... Só não me estendo mais, porque o restante da lista é realmente triste.

Por isso, é tão bom saber que alguém que era cético em relação a pessoas "religiosamente exageradas", que exibem e defendem uma "ascese rigorosa", ou seja, que querem fazer todo mundo crer que levam uma "vida irrepreensível"... Tornou-se santo. Trata-se do italiano São Filipe Néri, conhecido entre os romanos como o Pippo Buono, devido a sua bondade alegre e otimista, conforme Enzo Lodi em Os Santos do Calendário Romano - Rezar com os santos na liturgia (Paulus, 2007).

O monge beneditino alemão Anselm Grün, em seu maravilhoso livro 50 Santos (Edições Loyola, 2005), que já mereceu uma Resenha do Blog A Católica, explica:

Ele [Filipe Néri] desmascara o pathos pomposo como expressão de falsa religiosidade e desarma com seu sorriso todos os severos moralizadores, que muitas vezes apenas projetam suas necessidades reprimidas nos outros e a partir disso desenvolvem a sua teologia.

Filipe, em suma, foi um sacerdote que renunciou a toda fama, pompa e circunstância, que desconfiou de quem se acreditava "um cristão exemplar" e que, especialmente, riu de si mesmo. E fez os outros rirem. Segundo Anselm Grün, o escritor Reinhard Raffalt afirmou que esse santo - cuja memória a Igreja celebrou neste 26 de maio - incorporou "um novo elemento na tradição, que até então era considerado quase blasfemo: o humor".

Afinal, qual é a história de São Filipe Néri, tão amado pelos romanos?

O Pippo Buono nasceu em 1515, na cidade de Florença (Itália). Sua família era modesta. Grün nos conta que "um tio sem filhos o adotou para que aprendesse o ofício de comerciante. Mas logo Filipe percebeu que não servia para isso". Deixou o comércio e foi para Roma, onde se tornou estudante de Teologia e dedicou-se à assistência de peregrinos e de enfermos. E à conversa com os jovens, com os quais se encontrava nas ruas da capital italiana.

Mario Sgarbossa e Luigi Giovannini, em Um Santo para Cada Dia (Paulus, 1996), relatam que Filipe Néri acabou abandonando os estudos, "vendendo os livros para dedicar-se totalmente a atividades beneficentes". Os autores detalham:

Aos 24 anos de idade, havia feito um pacote de todos os livros que então possuía (exceto a Bíblia e a Suma Teológica, de S. Tomás) e os levara para vender na praça distribuindo depois o dinheiro obtido aos pobres. Desde aquele instante somente Deus haveria de ocupar seus pensamentos e coração.

O monge Anselm Grün afirma que "Filipe começou a chamar a atenção dos padres, que descobriram sua formação teológica. Insistiram para que ele se ordenasse padre, o que acabou acontecendo quando Filipe estava com 36 anos de idade".

Após a ordenação, de acordo com Enzo Lodi, o santo "foi morar junto à igreja de São Jerônimo da Caridade, onde deu início à obra que mais tarde (1554) se chamou Congregação do Oratório, na qual meninos e jovens se reuniam para entretenimentos espirituais, caritativos e também culturais". Conforme Sgarbossa e Giovannini, trata-se de "uma congregação religiosa de padres, empenhados de modo particular na educação de jovens". Em 1575, com a bula (documento papal) de fundação, a obra pôde se estender para fora de Roma.

Fachada da Igreja de Santa Maria della Vallicella - sede da Congregação do Oratório
Fotografia de Lalupa

Interior da Igreja de Santa Maria della Vallicella - sede da Congregação do Oratório
Fotografia de Lalupa

E Filipe Néri educava os meninos, "divertindo-os". Grün descreve: "Jogava com eles, fazia brincadeiras e, em algum ponto, dirigia a conversa para assuntos religiosos, mas de uma maneira que os jovens não se sentiam cobrados". Enzo Lodi aprofunda a elucidação de seu método:

A hilaridade virtuosa, melhor, a pedagogia alegre, que lhe permitia ser sempre jovem, atraindo os jovens com o jogo, com os passeios, com a arte, com o estilo alegre e às vezes despreocupado, era seu método educativo, que sabia tornar sempre agradáveis e simpáticas as coisas de Deus.

O canto e a música, que ele favoreceu também (...), eram acompanhados da proposta de meios alternativos ao vício, a fim de dar livre curso a uma alegria sadia, na persuasão de que "os ânimos alegres e inclinados à alegria podem ser mais facilmente guiados nas vias do Espírito".

O autor destaca outra virtude cristã em São Filipe Néri: "a confiança que ele tinha nos meios sobrenaturais, especialmente no sacramento da confissão, pelo qual formou cristãmente grandes personalidades e gerações de romanos (...)".

Segundo Sgarbossa e Giovannini, "depois dos 75 anos de idade", o santo "limitou sua atividade ao confessionário e à direção espiritual". Grün revela que "dizia pouquíssimas coisas aos confessantes. Mas acertava na mosca. E tinha uma sensibilidade psicológica espantosa para a verdadeira e a falsa espiritualidade".

O monge beneditino narra ainda que Filipe Néri enfrentou "todo tipo de intriga armada por padres que tinham inveja dele. Mas os papas o estimavam".

Saint Filip Neri (Sem Data) - Autor Desconhecido

Não obstante o apreço de Pontífices como Pio IV, que governou a Igreja de 1559 a 1565 e teria morrido em seus braços, o santo "recusava todos os cargos eclesiásticos. Ele queria continuar sendo o modesto padre". De acordo com Enzo Lodi, para não ceder à admiração das multidões, [o Pippo Buono] esforçava-se para fazer alguma coisa estranha (como 'piedoso louco') ...". Anselm Grün esclarece essa sua postura:

Filipe se sabe aceito por Deus. Por isso ele pode rir de si mesmo e de suas fraquezas. Ele nos oferece o caminho da liberdade e da leveza. Como Filipe se sentia ancorado em Deus, ele pôde renunciar a toda fama e influência. (...) Sua jovialidade simplesmente irradia. Ele exala leveza e misericórdia.

Se, como Enzo Lodi cita, Deus "glorifica seus santos e os dá à Igreja como modelos de vida evangélica", o próprio monge beneditino nos instiga e nos esclarece sobre como seguir os passos de São Filipe Néri: "Tenha a coragem de não mais se queixar de seus erros e fraquezas; ria deles. Há muito eles já foram elevados à misericórdia de Deus. Você pode rir de si mesmo quando não se julga tão importante".

Aos 80 anos de idade, o santo italiano deixou este mundo. Antes, tomou o cuidado de queimar todos os seus escritos. Nada restou. Conforme Mario Sgarbossa e Luigi Giovannini, após a sua morte, em 26 de maio de 1595, "os médicos averiguaram sobre seu tórax uma esquisita curva das costelas, como a dar espaço maior ao grande coração do apóstolo de Roma". De fato, Enzo Lodi relata que, no Pentecostes de 1544, Filipe Néri "teve a visão de uma esfera de fogo" que entrou em seu coração. Inflamando-o.

São Filipe Néri, Rogai por Nós!

A alegria no Senhor
(Os Cinco Minutos dos Santos, Editora Ave-Maria)

Deus, nosso Pai, dai-nos a alegria e a fé inabalável
que nascem da paz e da simplicidade de coração.
Dai-nos a serenidade que nasce
da consciência de estar cumprindo nossa bem-aventurança.
Dai-nos a fortaleza que nasce da certeza
de que estais conosco
e caminhais a nosso lado hoje e sempre.

Que não se aflijam nossos corações,
pois Vós tudo enxergais,
tudo debelais,
tudo encaminhais,
e com sabedoria tudo remediais com Vossa medicina.

As inquietudes, as preocupações
não perturbem a alegria e a paz de nosso semblante,
pois a Vossos olhos "maternais" nada é oculto,
nada é esquecido e toda injustiça será reparada.

O medo, a insegurança não nos apavorem,
pois como a filhos velais por nós dia e noite;
e nossa vida sustentais continuamente.

Vossa paz - que excede toda compreensão -
guarde a alegria e a firmeza de nossos corações e pensamentos.
Que nos alegremos sempre Naquele
que nos conduz em segurança e nos livra de todo mal.

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Atribuição: Ana Paula Camargo (acatolica.blogspot.com).
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