21 de dezembro de 2010

Introspectivos não precisam de Grandes Aventuras (externas)

Quem se movimenta pouco internamente é que teria necessidade
de grandes feitos no mundo exterior.
Por exemplo: envolver-se em esportes radicais como o alpinismo

Adoro os locutores de estações. Não. Não de estações de rádio, e sim de aeroporto, metrô, trem. Adoro aquele sinalzinho que dá antes de eles falarem: Tum Tom... Atenção passageiros blá, blá, blá, blá, blá. Aquela voz monocórdia, que a caixa de som abafa e que soa quase tão ruim que é quase inaudível ou incompreensível. Contudo, eu gosto.

Parece que têm algo muito importante a dizer. Como os plantões dos telejornais enquanto assistimos à TV: Tan Tan Tan Tan Tan tantantantan... O plantão do jornal Tal informa... A diferença é que enquanto os plantões na TV, geralmente, interessam a muita gente, os recados dos locutores de aeroportos, etc. dizem respeito a uma minoria aflita. Para a maioria, é uma bobagem.

Por mínimo que seja o interesse que despertam - dirigem-se aos poucos passageiros daquele voo ou trem específico - guardam, porém, uma solenidade. Sei que muitas vezes não me importa que a partida para Mossoró ou Uberlândia vai ocorrer dentro de 20 minutos. Mas, fica sempre em mim aquela expectativa de que, talvez, possam me surpreender e anunciar algo relevante.

Tum Tom... Atenção, Ana Paula. Você mesma. De cabelos escuros com reflexos cor de cobre e óculos de aros vermelhos. Uma oportunidade incrível aguarda por você em um outro lugar. Dirija-se à plataforma, onde um vagão já está reservado. Embarque e não se arrependerá. Tenha uma boa tarde.

Fico me perguntando: se isso ocorresse, será que eu embarcaria? Será? Sorte minha que isso nunca aconteceu e, provavelmente, nunca acontecerá. Assim, minha vida pode seguir como está: tátil, mais ou menos previsível, segura. Não obstante o enxame de abelhas que me rondam chamado problemas.

É que no fundo, no fundo, sou uma acomodada. Tudo me dá preguiça: escolher as roupas, ajeitar a mala, ir correndo para a estação, esperar com aflição a hora de partir, aguentar o trajeto moroso, chegar. Apresentar-se no saguão do hotel, pegar o elevador, tomar banho, abrir e fechar a mala, jantar...

Pensando bem, adoro acenar da plataforma para os que chegam e os que vão. Minha sede não é de aventura. É de Deus. Não que uma coisa exclua a outra. É que dentro de mim há montanhas-russas e desfiladeiros que me fornecem cota suficiente de adrenalina. Foi uma psicóloga que me explicou: geralmente, quem gosta de se deslocar muito é porque tem pouco movimento por dentro.

Fotografia de Vera Kratochvil

Entendi: os introspectivos como eu não têm necessidade de fazer e desfazer malas, escalar montanhas ou descer rios sinuosos em caiaques velozes. Um poema, uma boa prosa, uma ideia já satisfazem, porque geram toda uma cadeia de pensamentos que preenche a nossa existência. Ah! Então, posso me chamar de "alpinista de mim mesma", "caiaqueira de minha alma", "surfista da minha mente", "turista do meu eu"?

Gostei. Locutores de estações: podem prosseguir entoando suas chamadas monocórdias. Há viagens muito mais interessantes que faço sem precisar do seu (simpático) chamado. Bom trabalho para vocês e Boa Viagem para mim!!


Fotografia da moça escalando as pedras por Anna Cervova

~Ana Paula~A Católica
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Atribuição: Ana Paula Camargo (acatolica.blogspot.com).
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