Um filme exibido na Rede Globo tem muito a ver
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Sou do tempo em que a Sessão da Tarde da Rede Globo de Televisão passava filmes decentes. Digo: dignos de serem vistos. Pela minha mente perfilam-se os longas do maravilhoso comediante Jerry Lewis; dos Três Patetas; aqueles dos anos 1970 sobre acampamentos juvenis e relação pais e filhos; aqueles dos anos 1980 sobre cursos de verão e temáticas mais dramáticas como Só Resta uma Esperança (título que ganhou no Brasil), com o então jovem e gatíssimo Mark Harmon.
Pois um desses filmes de drama, do tempo em que a Rede Globo não tinha medo de pôr qualidade no conteúdo que nos oferecia à tarde, me veio hoje assim... Meio do nada. (Será?)
Não me lembro do título, nem dos atores. Só guardei o roteiro e - talvez - o nome da personagem principal: Izobel. Tratava-se da história de uma mulher de cerca de 40 anos de idade, divorciada, que reencontra o amor num homem cerca de dez anos mais moço. No final do filme - cena que mais me marcou -, o rapaz pichava no muro que dava para um túnel: "Izobel, eu te amo". Em letras pretas e garrafais.
O longa não discorria sobre uma história de amor água com açúcar (como dizemos aqui no Brasil). O cerne do roteiro abordava um drama (eu falei de "temática dramática", lembra?).
Izobel era uma mulher bonita, interessante, culta... Porém, não acreditava em si. Padecia - embora de jeito algum aparentasse isto - de falta de autoestima. Costumava pintar quadros, mas os anos de casada levaram-na, pouco a pouco, a abandonar a vocação. Há um momento no filme - e disto me recordo bem - em que ela resolve mostrar suas obras antigas para o novo namorado. Ele se surpreende, se entusiasma e a elogia: "Izobel, você é boa! Você é muito boa! Você é ótima! Você tem que voltar a pintar! Você tem que retomar!".
Izobel apela, xinga o namorado, diz que ele está "mentindo". Eles brigam. Até se separam.
Procurando entender a reação irada da amada, o jovem acaba descobrindo que seu ex-marido, na época em que ainda era casada, acabou com toda a confiança que ela tinha no próprio talento. Também se não me falha a memória, há uma cena na qual Izobel, em prantos, diz: "Eu sou ruim. Eu sou ruim. Ele [seu ex-marido] tinha razão. Eu não pinto bem...".
Lembro que terminei de assistir a esse filme impressionada com o tanto que uma pessoa pode "destruir" alguém. Com o tanto que um ser humano pode ser convencido do contrário. O ex-marido de Izobel fez uma "lavagem cerebral" nela, persuadindo-a de que não sabia pintar bem. O namorado entra na sua vida e tenta fazê-la crer que sim, ela pode, deve e precisa pintar.
Young Woman Drawing (1801), Marie-Denise Villers |
Nas cenas finais, parece-me que o namorado não apenas a induz a voltar aos pincéis, como apoia (ou financia) uma viagem de Izobel a Paris, na França, para que ela pudesse retomar os estudos de Artes. É aí, internauta d'A Católica, que surge a pichação no muro, que mencionei no início deste Post. Dentro do táxi, a caminho do aeroporto, Izobel lê o que o namorado lhe escreveu: "Eu te amo".
Para algumas feministas - quiçá, para todas elas -, esse filme pode parecer a ilustração perfeita da "manipulação masculina": os homens da vida de Izobel fazem o que querem com ela. Ou a destroem ou a estimulam.
Para mim, no entanto, o longa exibido anos atrás na Sessão da Tarde não se resume a uma questão de gênero: você, eu, todos nós temos o dom de nos influenciarmos mutuamente. De contribuir para soterrar a autoestima de alguém ou para motivar uma pessoa a crescer na direção de sua vocação. Quantos artistas, políticos e outros profissionais bem-sucedidos (famosos ou não) devem a sua carreira ao empurrão generoso que receberam de alguém?
É aqui que entram os papéis cruciais que os padres e nós, cristãos leigos, temos.
Fotografia de Carolus 18:48, 13 May 2007 (UTC) |
Nossa missão é a de promover os valores do Evangelho, da mensagem de Jesus Cristo. E nos esmerarmos em estimular as pessoas ao nosso redor a seguirem nessa direção.
O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, no dia 12 de abril, o direito de as mulheres grávidas de fetos sem partes do cérebro - portadores de anencefalia - a abortarem. Foi um choque (ou deveria ser) para os mais de 190 milhões de brasileiros, já que cerca de 90% da população no Brasil são cristãos: 64,6% são católicos, 22,2% são evangélicos e 2,0% são espíritas, segundo o Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Infelizmente, vivemos em uma sociedade que caminha pelas vias do pragmatismo. O pensamento que conduz muitos de nós é: "se me incomoda, se pode vir a me transtornar, eu elimino e pronto". Vamos sendo envolvidos pela nuvem espessa desse modo de proceder e mesmo que ela escandalosamente contrarie tudo aquilo em que dizemos acreditar, nós nos deixamos persuadir. Ou melhor: nós nos iludimos de que ela seja intransponível e que só resta... Nos envolvermos nela.
Daí vem a importância nossa, de cristãos leigos, e principalmente dos padres, os quais têm no altar um palco sagrado de onde falam e são ouvidos pelos fiéis, incluindo aqueles que têm outro palco nas rádios (como Padre Marcelo Rossi, apresentador do programa Momento de Fé na Rádio Globo) ou na TV (como Padre Fábio de Melo, que apresenta o Direção Espiritual na TV Canção Nova), enfim, a importância de todos os padres de lembrarem e convencerem os fiéis de que a mensagem de Cristo é A FAVOR DA VIDA. Sempre e sem exceção.
Fotografia de Salvador Sáinz |
Fotografia de Petr Kratochvil |
E não basta "lembrar". É preciso afirmar no púlpito que estão dispostos e disponíveis a orientar e a apoiar as mulheres na sua vocação primeva: gerar e guiar vidas. Onde e como? Resposta: nos confessionários, nos momentos de direção ou aconselhamento espiritual.
Se o STF toma uma decisão que autoriza e permite à mulher brasileira fazer uma escolha que contraria a vida, e se é notório que uma em cada cinco mulheres no Brasil fez alguma vez o aborto, conforme pesquisa de 2010 da Universidade de Brasília (UnB) e do Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero (Anis), sendo a imensa maioria dos brasileiros tementes a Deus, é de se levar em consideração a possibilidade real de os padres no Brasil e nós, cristãos leigos, estarmos falhando na nossa missão de disseminar nos corações o respeito e o apego à vida - seja ela como for.
Se uma em cada cinco brasileiras já abortaram, a evangelização está gravemente comprometida. Se uma fiel cristã e católica opta por livrar-se do "problema" de dar à luz um feto anencéfalo através do aborto, os padres brasileiros estão falhando na sua missão de lembrar e convencer essa mulher da sua vocação.
Clamo aos padres e a nós, leigos, para que sejamos tão incisivos na defesa da vida e especialmente no apoio moral e espiritual às mulheres grávidas de anencéfalos quanto aquele rapaz no filme da Sessão da Tarde foi com a namorada Izobel: "Você é boa! Você tem que pintar! É o seu destino! Acredite nisso!". Os padres deveriam enfatizar do altar, durante os seus sermões, e nos confessionários, durante os aconselhamentos: "Você é boa! Você tem que gestar e dar à luz! É o seu destino de mulher cristã e temente a Deus! Acredite nisso!".
A praga do aborto começa a espalhar seus braços daninhos pela nação brasileira, porque padres e fiéis leigos não se colocam com insistência e força A FAVOR DA VIDA.
Independentemente de o STF decidir pela descriminalização do aborto de fetos anencéfalos, o que importa no fim das contas é o posicionamento da mulher diante dessa questão. Convencida por padres e leigos, envolvida não pela nuvem espessa do pragmatismo, e sim pela Boa Nova de Cristo, ela recusará o aborto e encontrará nos seus irmãos de fé, na Igreja, o esteio de que necessita para seguir adiante na sua vocação de mãe. Mesmo que (no caso dos bebês com anencefalia) por tão breve tempo.
Fotografia de Petr Kratochvil |
P.S. Leia mais:
1) Aborto de anencéfalos: 8 ministros favoráveis e 2 contra - Canção Nova Notícias;
2) Uma em cada cinco mulheres de 40 anos já fez aborto, diz pesquisa - portal Terra.