25 de junho de 2013

Milhares de "João Batista" pelo Brasil afora

Como o primo de Cristo há 2.000 anos,
brasileiros vão às ruas clamar pelo fim da corrupção.
Devem só tomar o cuidado de não passarem de "caniços ao vento"

Imagem: Biblical illustration of Gospel of Mark Chapter 1 (1984),
Biblical illustrations by Jim Padgett

Manifestação contra aumento da tarifa de ônibus SP (BRASIL) -
7 de junho de 2013 - Fonte: https://secure.flickr.com/photos/mariaobjetiva

O que me marca na história do primo de Jesus, cuja natividade a Igreja celebrou nesse 24 de junho?

Duas coisas: a sua capacidade de ascese, ou seja, de mortificar-se, de viver sozinho no deserto a pão e água (ou melhor, a gafanhoto e mel) e a sua impetuosidade, ousadia, atrevimento mesmo de escancarar para os hipócritas e poderosos os seus pecados. Ele é "aquele que grita no deserto". Não é que me lembra os brasileiros "que gritam" nas ruas nas últimas semanas? Que gritam, como há 2.000 anos, contra a devassidão de alguns políticos (os poderosos) do Brasil?

João Batista não é uma figura simpática. Tomava mel, mas não tinha nada de doce. Era duro. Exigia muito de si mesmo e exigia dos outros. Não sei como conseguiu ter seguidores. Não dançava, mal comia; enquanto Jesus é muitas vezes retratado na Bíblia participando de festas (como as Bodas de Caná) e de banquetes (na casa de Mateus e na de Zaqueu, por exemplo). À 1ª vista - ou à 1ª lida -, parece mais fácil seguir a Cristo do que a João Batista. (Sim, eu sei: é uma besteira o que acabei de escrever...)

Voltemos à meada.

Sobre o primo de Nosso Senhor, marca-me, ainda, o trecho bíblico no qual Jesus o elogia:

"Então por que fostes para lá? Para ver um profeta? Sim, digo-vos eu, mais que um profeta. É dele que está escrito: 'Eis que eu envio meu mensageiro diante de ti para te preparar o caminho' (Ml 3, 1). Em verdade vos digo: entre os filhos das mulheres, não surgiu outro maior que João Batista. No entanto, o menor no Reino dos céus é maior do que ele. Desde a época de João Batista até o presente, o Reino dos céus é arrebatado à força e são os violentos que o conquistam (Mt 11, 9-12)".

The Voice in the Desert (between 1886 and 1894), James Tissot

Quanto ao versículo "Desde a época de João Batista até o presente, o Reino dos céus é arrebatado à força e são os violentos que o conquistam", a nota de rodapé da Bíblia de Jerusalém (Paulus, 2002) afirma que ele foi interpretado de vários modos. Dentre os quais, destaco: "pode-se tratar da santa violência daqueles que se apoderam do Reino à custa das mais duras renúncias" ou "há quem traduza: 'o Reino dos Céus abre caminho com violência', isto é, se estabelece com poder, apesar de todos os obstáculos".

O que me recorda outra passagem bíblica, aquela na qual Cristo diz: "Não julgueis que vim trazer a paz à terra. Vim trazer não a paz, mas a espada. Eu vim trazer a divisão entre o filho e o pai, entre a filha e a mãe, entre a nora e a sogra, e os inimigos do homem serão as pessoas de sua própria casa (Mt 10, 34-36)". A nota da Bíblia de Jerusalém elucida: "Jesus é 'sinal de contradição' (Lc 2, 34) que, embora não queira discórdias, as provoca necessariamente em virtude da escolha que exige".

Enfim: não expus nenhuma dessas passagens da Sagrada Escritura, a fim de justificar as depredações que vêm ocorrendo nos protestos aqui no Brasil.

O que fica do exemplo de João Batista e de seu primo, Aquele que ele anunciou no deserto, Nosso Senhor Jesus Cristo, é que os brios, o caráter, a retidão, a honestidade, a dignidade e tantos outros atributos que exigimos de nossos prefeitos, governadores, presidenta do Brasil, dos nossos representantes nas câmaras, assembleias legislativas e no Congresso Nacional, temos que cultivar e mostrar, em 1º lugar, em nós mesmos.

A voz dos brasileiros que estão nas ruas há dias só terá firmeza e frutificará, na minha opinião, se tudo aquilo que ela reclama dos políticos, cada um dos manifestantes praticar antes em casa, no trabalho, no supermercado, na padaria, na drogaria, no lava-jato, no cinema... No dia a dia da própria vida. (Há um Post do Blog justamente a respeito disso: Eu não acuso político de "corrupto".)

Senão, cada um dos que se posicionam de punho em riste e cartaz nas mãos nas Avenidas Paulista (São Paulo), Antônio Carlos (Belo Horizonte) e em outras tantas Brasil afora não será "um João Batista", como sugere o título deste Post d'A Católica. Cada brasileiro indignado, que não demonstra ética no próprio comportamento como cidadão, não passa de "um caniço agitado pelo vento" (Mt 11, 7): seu grito não ressoará.

Manifestação contra aumento da tarifa de ônibus SP (BRASIL) -
7 de junho de 2013 - Fotografia de Maria Objetiva


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