21 de fevereiro de 2013

Meu padrinho, Antônio

Tenho a sorte e a bênção de ter um padrinho (com nome de santo)
vivendo na África do Sul há mais de 12 anos, mas presente a minha vida toda.

Mesmo com todo um oceano Atlântico entre nós...

Imagem: Antônio em São Paulo - 2011 - Ana Paula~A Católica (acatolica.blogspot.com)

Minha lembrança mais remota é um Fusca verde-escuro. Foi um dos primeiros carros do meu padrinho, Antônio - o Toninho, ou melhor, o Padinho. Tenho uma recordação vaga de um piquenique no alto de um morro, gramado e rodeado de árvores, e o Fusca lá embaixo, estacionado. Era tão vidrada no automóvel dos meus padrinhos, Suzana e Antônio, que quando ia ao Parque Municipal com os meus pais, brincar em uma espécie de carrocel de veículos, sempre escolhia a réplica de um Fusca verde-escuro para me assentar.

Outra lembrança é a piscina para crianças do clube Cruzeiro.

Ao contrário dos outros pais, que preferiam olhar os filhos à distância, sob a sombra e com a cerveja gelada numa das mãos, o Padinho estava lá, sob o sol, dentro da piscina maxi-rasa, com uma boia em forma de peixe nas mãos, correndo, ou melhor: nadando, atrás do filho Flávio Augusto, da minha irmã Andréa Cristina e de mim, gritando: "Eu sou o jacaré! Lá vem o jacaré!". Lembro também o olhar meio perplexo, meio admirado das outras crianças, como se quisessem ter um pai como aquele.

Mais uma lembrança: meu padrinho, minutos infindáveis na fila de uma montanha-russa, enquanto Flávio Augusto, a filha caçula, Viviana Paula, Andréa Cristina e eu nos divertíamos em outros brinquedos. Ele ficava em pé, na fila, apenas para guardar lugar para todos nós, já que a tal montanha era concorridíssima.

Lembro também as mesas impecáveis de café-da-manhã que ele montava todos os sábados na casa dele. Meu padrinho achava "um crime" cortar o pão com a faca da manteiga e usar a faca de cortar o pão para passar a manteiga. Tudo tinha a sua função, o seu lugar. E o café-da-manhã ficava mais saboroso, tamanho o zelo da apresentação. O presunto parecia de outro mundo!...

Uma de suas lições: não se pode ficar à mesa com os braços abertos. Então, "obrigava" Flávio Augusto, Andréa Cristina e eu a colocar - e segurar - sob ambos os braços jornais dobrados, a fim de mantermos a postura. (Flávio Augusto detestava isso e chorava. Assim como chorou na vez em que meu padrinho não o deixou almoçar sem camisa e com o boné. Obrigou-o a pôr uma e tirar o outro.)

Mais lembranças (e desta eu me orgulho muito): no distante ano de 1983, meu padrinho acordou Flávio Augusto, Andréa Cristina e eu, para irmos à praia ver o nascer do sol. Estávamos em Cabo Frio. Na volta, fomos à padaria. Já na calçada, um senhor se aproximou e perguntou, referindo-se a nós três: "São todos seus [filhos]?". Meu padrinho respondeu: "Sim. Todos". Fiquei tão contente por saber que o Padinho teria orgulho de ser o meu pai!...

Antônio e eu em São Paulo - 2011 - Fotografia: Tuti Camargo

Antônio e eu em Belo Horizonte - 2011 - Fotografia: Magali

No também distante ano de 1986, meu padrinho e minha madrinha, Suzana, me acordaram de madrugada, para chegar à janela da sala-de-estar, a fim de ver o tal cometa Halley. Eu havia dormido na casa deles apenas para isto: ver o tão afamado cometa. Dizem que ninguém no planeta Terra conseguiu visualizá-lo. Eu consegui. Uma estrela brilhante, enorme, no céu. Fiz até um desenho. Inesquecível.

Padinho é um homem exigente, sistemático. Não esqueço a vez em que mandou o Flávio Augusto voltar várias vezes à farmácia, para que o vendedor finalmente lhe desse o produto e - especialmente - o troco certos. Porém, na exata medida em que é honesto com as pessoas e caprichoso em tudo o que faz, ele é extremamente bem-humorado, engraçado. A sua risada, seus ditos espirituosos, suas piadas, não há quem resista e permaneça sério. É tão bom se acercar de pessoas assim!...

Outra recordação muito, muito forte é a sua religiosidade.

Sobre o criado do meu padrinho, a primeira imagem de santo que vi na vida: Santo Antônio de Pádua. Creio que havia um rosário também. Ele ia à Santa Missa todos os domingos. E se minha irmã e eu estivéssemos passeando na casa dele, também éramos "obrigadas" a ir. Ele deu a mim e à Andréa Cristina uma Bíblia infantil. Pena que ela está na casa dos meus pais e não poderei reproduzir a dedicatória que fez por ora.

Há outras lembranças, como o dia em que o meu padrinho foi até o meu colégio olhar no mural de avisos se eu havia passado de ano ou ficado em recuperação (sempre fui muito estudiosa e neurótica!). Ou a noite em que uma lagartixa me aterrorizava - eu estava sozinha em casa - e ele ficou comigo ao telefone até que me tranquilizasse e o bicho asqueroso fosse embora.

Antônio em São Paulo - 2011 - Ana Paula~A Católica (acatolica.blogspot.com)

Antônio e Suzana em Belo Horizonte - 2011 - Ana Paula~A Católica (acatolica.blogspot.com)

Todas essas recordações - e muitas, muitas outras - só foram possíveis, porque convivi com o meu padrinho. Sempre considerei a casa dele e da minha madrinha, Suzana, uma extensão do meu próprio lar. As fotografias dos meus aniversários, de várias viagens e de momentos casuais, como um almoço de sábado ou um lanche à tarde, durante a semana, trazem estampados os rostos deles e dos filhos, Flávio Augusto e Viviana Paula.

Não. Ele está bem. Padinho está vivinho da Silva (como dizemos aqui no Brasil). Para você ter uma ideia, hoje, 21 de fevereiro, é o seu aniversário. Dia de São Pedro Damião.

Se escrevi este Post d'A Católica com os verbos no passado, se usei demasiadamente as palavras "lembrança" e "recordação", é porque simplesmente o meu padrinho, sua esposa e sua filha, Viviana Paula, estão longe de mim. Literalmente. Geograficamente, vivem na África do Sul. Suas raízes estão fincadas lá há mais de 12 anos. A nós, que permanecemos no Brasil, restaram os frutos (ora doces, ora amargos) da saudade.

A mim especificamente, resta este amor intenso, esta gratidão doída, esta dívida irremunerável que adquiri ante tudo o que fizeram - e ainda fazem - por mim. Padinho querido: que bom que você existe. FELIZ ANIVERSÁRIO!

Copa do Mundo na África do Sul - Brasil x Costa do Marfim - Junho 2010 -
Shailen, a esposa Viviana Paula e meu padrinho, Antônio - Arquivo de Família

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