9 de março de 2012

Virei... MÃE!

... E mesmo que não tivesse me tornado uma,
aceitaria dócil a Vontade de Deus.
Todos temos dons intransferíveis para fazer frutificar


(Fotografia: Arquivo de Família)

finalmente, entrei para a categoria das MÃES. e vou lhe contar uma coisa, internauta d'A Católica: está sendo uma experiência bastante diferente. "diferente", não pra melhor nem pra pior. apenas... diferente. bem distante do que eu supunha. muito mais árduo, exigente, intenso. só não posso descrever (embora, confesso, adoraria fazê-lo), porque está tudo tão recente, que seria uma opinião precoce, afoita, descabida. deixaria aquele gosto de banana verde na minha e na sua boca e nenhum de nós sairia contente.

acompanho nas noites de sexta-feira, pelo canal de TV a cabo Discovery Home and Health, dois programas sobre salas de parto. o que eu experienciei não teve absolutamente nada, nada, nada a ver com o que aquelas mães norte-americanas passam. (a não ser, admito, pela peridural.) todo aquele sofrimento, aqueles gemidos, aquelas horas que custam a passar. os gritos lancinantes. não tive. minha dor veio depois.

com o passar dos dias e das semanas, fui me dando conta de que enquanto eu e meu filho - sim: é um rapazinho - vivermos, ele será responsabilidade minha. minha e do meu marido. contudo, "mais" minha. porque entendi bem rápido que o papel da mãe neste conto-de-fadas, nesta história encantadora e sonhada por muitos casais chamada Maternidade e Paternidade, o encargo da mãe é, de longe e incontestavelmente, maior, pesado. e intransferível.

daí, internauta d'A Católica, me veio um sentimento de solidão inexplicável, que nunca, nunca experimentei.

nem naquela vez, nos idos de 1997, quando peguei o ônibus errado e desci a vários (bote vários nisso) quarteirões da minha casa. no relógio, 23h e saí andando morrendo de medo, naquela quase escuridão (quase, porque havia as luzes dos postes). não tinha viv'alma nas ruas. ninguém. only myself. eu andando o mais depressa que podia, subindo e descendo dos meio-fios, dobrando esquinas e fazendo curvas, a fim de não cruzar com nenhum bandido tão sozinho quanto eu. fugindo da ausência. do silêncio. do imponderável.

pois nas madrugadas em que amamento o meu filho, quando ninguém na minha família pode oferecer a ele o que só eu tenho, quando o sono cutuca as minhas pestanas e pesa as minhas pálpebras e eu estou que não me aguento mais de fadiga (já que há semanas não consigo dormir mais de três horas seguidas), lembro-me daquela noite: o papel da mãe é solitário. ela percorre all by herself as ruas da doação que se tornou a sua própria vida. só eu dobro as esquinas e desvio dos buracos nas calçadas para alimentar e aconchegar o meu filho.

(Fotografia: Arquivo de Família)

eu não seria a mais infeliz das criaturas mamíferas e pensantes se não tivesse me tornado mãe. por ser católica apostólica romana, acredito piamente na Vontade de Deus. o que me aconteceu de ruim ou de meramente desagradável nestes meus 35 anos de caminhada pela vida pode haver me causado alguma raiva ou tristeza. indignação e dar as costas para o Altíssimo cheia de decepção para com Ele, que algumas vezes não atendeu às minhas preces, jamais.

o que quero dizer é: acredito em destino, em missão. dessa forma, algumas coisas simplesmente escapam dos nossos planos. se, por alguma razão, eu não pudesse gerar filhos nem adotá-los, não me revoltaria. aceitaria abnegada. como já aceitei tantas coisas relativas a outras áreas da minha vida - como a profissional. todos temos nossas frustrações e, a partir delas, cheios de fé e de criatividade, tentamos fazer do limão uma limonada. revoltar-se é andar em círculos, portanto, uma perda de tempo.

nunca vou me esquecer de uma psicóloga doce, séria e maravilhosa que conheci (e que tem o nome da minha mãe: Magali). na época, há mais de 11 anos, ela devia ter cerca de 50 anos de idade. sem filhos e psicóloga especializada em atendimento de crianças, veja só. pois bem. aquela Magali me disse que quando não temos filhos de sangue ou de coração, podemos considerar nossas criações - um livro, um artesanato, etc. - "filhos" que geramos. e, assim, do nosso modo peculiar, vamos criando-os com carinho e deixando-os correr o mundo.

é uma comparação linda e consoladora para os que não se tornaram - nem se tornarão - pais.

nem todo mundo pode seguir a ordem "multiplicai-vos" (Gn 1, 28)¹. entretanto, pode-se acolher a que está implícita na Parábola dos talentos (Mt 25, 14-30; Lc 19, 11-27)²: fazer render os dons que recebemos, em vez de os escondermos, de os guardarmos ou até de nos lamentarmos por aqueles com os quais não fomos abençoados. viver é lutar sim, mas, muitas vezes, também é conformar-se com o que se tem e fazer a transformação a partir daí. isso é sabedoria.

e que Deus abençoe a nós, mães e pais que se multiplicaram, e a todos aqueles que são mães e pais de blogs, de canções, de textos, de imagens, de ideias, de empresas, etc., etc., etc. cada um com o que Ele deu. Amém.

(Fotografia de Ana Paula~A Católica - acatolica.blogspot.com)

P.S. ¹Passagem do Livro do Gênesis (Gn 1, 26-28):

A criação

Então Deus disse: "Façamos o homem à nossa imagem e semelhança. Que ele reine sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus, sobre os animais domésticos e sobre toda a terra, e sobre todos os répteis que se arrastem sobre a terra." Deus criou o homem à sua imagem; criou-o à imagem de Deus, criou o homem e a mulher. Deus os abençoou: "Frutificai, disse ele, e multiplicai-vos, enchei a terra e submetei-a. Dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todos os animais que se arrastam sobre a terra."

²Evangelho Segundo São Mateus (Mt 25, 14-30):

Parábola dos talentos

Será também como um homem que, tendo de viajar, reuniu seus servos e lhes confiou seus bens. A um deu cinco talentos; a outro, dois; e a outro, um, segundo a capacidade de cada um. Depois partiu. Logo em seguida, o que recebeu cinco talentos negociou com eles; fê-los produzir, e ganhou outros cinco. Do mesmo modo, o que recebeu dois, ganhou outros dois. Mas, o que recebeu apenas um, foi cavar a terra e escondeu o dinheiro de seu senhor.

Muito tempo depois, o senhor daqueles servos voltou e pediu-lhes contas. O que recebeu cinco talentos, aproximou-se e apresentou outros cinco: - Senhor, disse-lhe, confiaste-me cinco talentos; eis aqui outros cinco que ganhei. Disse-lhe seu senhor: - Muito bem, servo bom e fiel; já que foste fiel no pouco, eu te confiarei muito. Vem regozijar-te com teu senhor. O que recebeu dois talentos, adiantou-se também e disse: - Senhor, confiaste-me dois talentos; eis aqui os dois outros que lucrei. Disse-lhe seu senhor: - Muito bem, servo bom e fiel; já que foste fiel no pouco, eu te confiarei muito. Vem regozijar-te com teu senhor.

Veio, por fim, o que recebeu só um talento: - Senhor, disse-lhe, sabia que és um homem duro, que colhes onde não semeaste e recolhes onde não espalhaste. Por isso, tive medo e fui esconder teu talento na terra. Eis aqui, toma o que te pertence. Respondeu-lhe seu senhor: - Servo mau e preguiçoso! Sabias que colho onde não semeei e que recolho onde não espalhei. Devias, pois, levar meu dinheiro ao banco e, à minha volta, eu receberia com os juros o que é meu. Tirai-lhe este talento e dai-o ao que tem dez. Dar-se-á ao que tem e terá em abundância. Mas ao que não tem, tirar-se-á mesmo aquilo que julga ter. E a esse servo inútil, jogai-o nas trevas exteriores; ali haverá choro e ranger de dentes.

Fonte: Bíblia online Ave-Maria

Licença Creative Commons
Atribuição: Ana Paula Camargo (acatolica.blogspot.com).
Este trabalho está protegido
por uma LICENÇA CREATIVE COMMONS.
Clique no Link para conhecê-la.