Há três anos, quando pessoas próximas (parentes, amigos) ficaram sabendo que Farney e eu nos casaríamos após 8 anos juntos - seis de namoro e dois de noivado -, ele e eu ouvimos comentários "interessantes". O primeiro foi em 25 de maio de 2008 - guardei a data, porque ocorreu em uma feira de livros aqui em Belo Horizonte, quando adquiri a obra Teresa de Ávila, de Walter Nigg (Edições Loyola).
Naquele dia, uma conhecida do meu marido me perguntou se eu colocaria o sobrenome dele. Respondi que não, que o meu nome completo seguiria o mesmo. Ante a minha resposta, eis "a pérola" que ela soltou: "Melhor assim. Quando tiver que se separar será mais fácil...". Juro, internauta d'A Católica. Não estou brincando. Eu ouvi isso às vésperas do meu casamento.
Alguns meses depois, quando os convites já estavam distribuídos, recebi um telefonema no qual um conhecido meu me desejava Tudo de Bom... Teria sido uma ligação maravilhosa, se ele não tivesse feito questão de acrescentar aos seus votos de Felicidades esta observação: "Mas não se esqueça, Ana Paula. Casamento não tem que ser para sempre. Se tiver que se separar, separe!".
As lembranças desses comentários vieram à tona neste 30 de novembro, porque me deparei com as notícias sobre a nova pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE. Os títulos dos artigos na Internet variavam entre Taxa de divórcios atinge seu maior valor em 2010 no Brasil e Taxa de divórcio sobe a 1,8 para cada mil brasileiros.
Fotografia de Frank Vincentz |
Achei curiosa a coincidência, pois em 22 de novembro a agência de notícias Zenit publicou o seguinte artigo: Uma Segunda Chance Para o Matrimônio, cujo subtítulo é "Dicas de como reduzir os divórcios". Reduzir? Segundo o texto do site Exame.com, para Cláudio Crespo, gerente de estatísticas vitais do IBGE, "os números [da pesquisa do instituto] confirmam a consolidação da aceitação do divórcio pela sociedade brasileira".
É verdade: os comentários que Farney e eu tivemos que escutar ao anunciarmos o nosso matrimônio em 2008 demonstram que Crespo está com a razão.
O divórcio não somente é aceito aqui no Brasil, como já é esperado por alguns parentes e amigos. Parece que junto com o convite bonito, guardado com carinho em um envelope duro, com os nomes dos noivos e de seus pais em alto relevo e o endereço da paróquia onde se dará a cerimônia, aquelas pessoas conseguem "ver", embora em nenhum lugar esteja legível, a data da separação...
Eu não as culpo.
Há 50, 40 anos atrás, o desquite (o divórcio só aconteceu aqui no Brasil em 1977) era um estigma.
Se alguém entrasse em uma sala de aula e perguntasse às dezenas de alunos ali reunidos quantos eram filhos de pais separados, um, dois ou mesmo nenhum deles levantaria a mão. Hoje, ano de 2011, quando a lei do divórcio direto já está em vigor por aqui, a pergunta teria que ser invertida: quantos ainda são filhos de casais que permanecem juntos? A mesma quantidade - um, dois ou nenhum deles - ergueria a mão.
A fita VHS da festa do aniversário de 15 anos da minha irmã Andréa Cristina e da minha prima Mônica Alessandra, que debutaram juntas, exibe casais de parentes e amigos celebrando, aparentemente alegres e unidos. Quase 20 anos depois dessa gravação, um terço ou mesmo a metade deles não está mais junta - e afirmo que é uma pena não conviver mais com "tios" e "tias" que amávamos.
An angry Richard Arkwright (inventor) sending his wife to her parents - between 1850 and 1900 - Anonymous. Japanese Department of Education |
Uma vez me disseram que, por estar vulgarizado e não ser mais "um estigma", as crianças de hoje lidam melhor com o fim do casamento dos pais. Será? O artigo da agência Zenit, que gira em torno da recente publicação do Institute for American Values, qual seja: "Segunda chance: Uma proposta para reduzir divórcios desnecessários", enumera alguns levantamentos. Selecionei três:
1) A mortalidade infantil é maior e, em média, as crianças têm pior estado de saúde em comparação aos colegas que têm pais casados;
2) Adolescentes de famílias com pais divorciados são mais propensos ao abuso de drogas ou álcool, de entrar em conflito com a lei, e viver uma gravidez na adolescência;
3) Filhos de pais divorciados têm 50% a mais de chance de um dia terem seus casamentos fracassados.
Essas conclusões da publicação, baseadas em pesquisas realizadas nas últimas décadas, mostram que só porque algo se tornou "comum", "disseminado", "normal", não significa que seja "bom".
Todavia, eu não julgo.
Mesmo porque o próprio artigo da agência Zenit pontua que o relatório do Institute for American Values "não se opunha a todos os divórcios e admitiu que em alguns casos pudesse até ser necessário". Porém, uma questão se impõe: se as pesquisas apontam os malefícios do fim de um casamento, por que não se empenhar em tentar evitá-los? O mesmo texto expõe:
Em recente pesquisa foi demonstrado que 40% dos casais americanos já decididos pelo divórcio dizem que um ou ambos estão interessados na possibilidade de uma reconciliação. Infelizmente, afirmam os autores [da publicação], os juízes e advogados de divórcios, normalmente, não fazem qualquer tentativa para promover a reconciliação, concentrando-se em uma resolução rápida para o processo.
Entre as evidências contidas no relatório, estava o resultado de uma amostra de 2.484 pais divorciados. A mesma demonstrava que cerca de um em cada quatro pais acredita que seu casamento ainda poderia ser salvo. O processo de divórcio dos pais envolvidos estava quase no final. Para casais que procuram o divórcio o percentual de abertura à reconciliação poderia ser bem maior, adicionaram os autores.
Foto de X posid |
Existem soluções? Sim. De acordo com a publicação, eis o que poderia "ajudar a reduzir o número de divórcios" nos Estados Unidos:
1) Um período mínimo de um ano a partir da data de apresentação do divórcio até que ele entre em vigor. Esse adiamento poderia dar tempo ao casal para reconsiderar a decisão de se separar;
2) Junto com um período de espera é fundamental oferecer serviços para promover a reconciliação (como os aconselhamentos matrimoniais);
3) Programas de educação para o aprimoramento do matrimônio, especialmente para aqueles em maior risco de divórcio.
Voltemos ao Brasil. Conforme o texto do Estadão, que também divulga o estudo do IBGE, "nunca o brasileiro se divorciou tanto. Em 2010, foram registrados nos cartórios 243.224 divórcios. (...) Entre aqueles que se divorciaram no ano passado, em 22% dos casos o casamento havia durado no máximo 5 anos. Em 40,3% os casais não tinham filhos. A idade média ao divorciar foi de 43 anos". Quantos números!
The Reluctant Bride (1866), Auguste Toulmouche |
Outra coincidência. Neste 30 de novembro, a mesma agência de notícias Zenit publicou um outro artigo sobre o tema: O Chamado à Santidade no Casamento.
Recordando a vida e a obra do advogado Luigi Beltrame Quattrocchi e de sua esposa Maria Beltrame Quattrocchi, "o primeiro casal beatificado na história da Igreja", o texto afirma que eles foram elevados aos altares por João Paulo II em 2001, simplesmente porque viveram o casamento "como um caminho concreto para a santidade e para Deus". Segundo Dom Luciano Suriani, delegado das Representações Pontifícias:
Maria e Luigi foram exemplos vivos de como a vida cotidiana pode concretizar o chamado à santidade, que é a medida da vida cristã diária. Cinquenta anos atrás, o Concílio Vaticano II lançou um apelo à santidade da família e ele se realizou graças aos dois beatos. Precisamos que todas as famílias do nosso tempo, a exemplo deles, também se tornem pequenas igrejas, verdadeiras escolas de oração.
Não obstante as recomendações do relatório do Institute for American Values para a redução do número de divórcios nos Estados Unidos, quem sabe o exemplo dos italianos Luigi e Maria Beltrame Quattrocchi não seria uma solução mais eficaz para a "epidemia" do fim dos casamentos?
Professor Felipe Aquino, que já foi chamado de "Google da Igreja Católica" pelo seu vasto conhecimento, disse uma vez em um dos programas de que participa na TV Canção Nova que um casal que reza o Rosário junto, todos os dias, não se separa. Se não dermos conta de chegar a tanto, a leitura de textos bíblicos ou a recitação das preces do Pai Nosso, da Ave, Maria e do Glória ao Pai em família já seriam um passo e uma fonte de bênção para a nossa união matrimonial. É o que penso. E você?
Saúde e Paz!!
Fotografia de Andreas Praefcke |