Quadro do artista italiano Modigliani: Retrato de Uma Senhora De Limpeza (1916)
Nota: Esta crônica foi publicada no site da Canção Nova entre os meses de outubro e novembro de 2009. Creio que tem tudo a ver com o modo de ser e viver católico.
Há preconceitos de todo tipo no mundo. Para todos os gostos, ou melhor, desgostos. Mulheres e negros estão entre as principais vítimas e são alvo de piadas por causa disso. Um tipo de discriminação, porém, alastra-se como uma neblina densa que envolve a todos, mas que poucos querem notar. É o preconceito econômico.
Você pode senti-lo explicitamente se for a um shopping center sofisticado sem uma roupa de uma grande grife. Sobretudo as mulheres vão olhá-lo com desaprovação de cima a baixo como se fizessem um raio-x do seu cabelo até o dedão do pé, para deixar claro que você não está adequado. Já passou por esse embaraço?
Outro modo de experimentar esse tipo de preconceito é ficar desempregado. Principalmente se for por opção, como no meu caso. Ao me casar e escolher cuidar da casa (com tudo o que isso envolve: varrer, lustrar, lavar, passar, cozinhar) sinto na pele e nos ossos como as pessoas estão incomodadas e me atacam – o verbo é este mesmo: atacar.
Uma conhecida minha me chamou zombeteiramente de “doméstica”. Tempos depois, decidiu me agredir dizendo que “ser dona-de-casa emburrece”. Outra conhecida afirmou, entre risos, que estou com “a vida que toda mulher pediu a Deus”, insinuando que vivo sem fazer nada, sustentada pelo marido.
Uma terceira garantiu que não tenho do que me orgulhar por não trabalhar fora, que minha situação não é nada invejável. Noutro dia, ela me perguntou sem cerimônia: “Você não sente falta de ter o seu próprio dinheiro não?”.
O que já tive de ouvir em pouco mais de 1 ano como dona-de-casa – eu era jornalista profissional – infelizmente não para por aí. Também fui taxada de “imprestável”, “inútil”, “fracassada”...
Fiz o caminho inverso em pleno século XXI: há 50, 60 anos atrás, uma mulher era xingada de tudo quanto era nome se virasse para os pais ou o marido e dissesse: “Vou trabalhar fora e ganhar o meu próprio dinheiro”. Hoje, optar por ficar em casa é um escândalo. Alguém que faz isso só pode ser louca ou “vagabunda” mesmo.
E por que tanta celeuma? Caro internauta: porque para a nossa sociedade, quem não executa uma atividade remunerada, quem não produz algo que gere dinheiro, não vale nada. Tristemente, eu posso assegurar pra você que pro “mundão” não importa as suas conquistas emocionais nem espirituais, mas o TER, TER, TER.
Casei-me também há pouco mais de 1 ano e a preocupação dos outros é quando vamos começar a “construir o nosso patrimônio” e adquirir o primeiro imóvel. Já ouvi alguém dizer: “Fulano e beltrana”, referindo-se a um casal, “Estão bem, compraram um carro novo, um apartamento próprio...”. A ironia? Alguns anos se passaram e o fulano e a beltrana se separaram.
Pois a primeira coisa que levei para o apartamento onde vivo com meu marido foi um quadro de Jesus Misericordioso, que coloquei na sala-de-estar.
Para mim, o verdadeiro progresso é o que se faz no ritmo de Deus. No compasso de um café-da-manhã tomado a dois, depois de ler a Bíblia conforme a liturgia diária, na batida que embala a luta incessante de vencer as más tendências, na harmonia alcançada através do dar e do pedir perdão.
A habilidade de superar os desentendimentos, refrear o orgulho e domesticar o egoísmo, isso sim, é que deve demonstrar que um casal está “indo bem”, e não as aquisições materiais.
Conviver com o preconceito econômico e não me deixar abater por ele é um dos desafios da minha vida de dona-de-casa e recém-casada. Quando fico chateada com os comentários e a pressão dos outros e penso em desistir, olho para o quadro na minha sala-de-estar e digo para mim mesma: “Jesus eu confio em vós”.
~Ana Paula~A Católica