11 de julho de 2014

Desenredada

Foto de Lauri Rantala from Espoo, Finland - European Perch

Minha sorte
tem espinhos.
Como afagá-la?
Como peixe
cru: é viscosa.
E dolorida.

Lembra
minha irmã e eu
brigadas, e abraçadas
de castigo.
Em prantos,
enredada numa
sorte
que me repulsa.

Ninguém se toca
com este peixe
que exala?

Queria polvo,
lula, alga,
espuma,
sereia, Netuno,
tridente.
Menos isto
tão preso a mim.

Deus
se faz mouco
à agonia.
Vivo
de boca aberta,
num grito mudo.
Não mexe um dedo
que criou Adão.

Eu me mexo:
tem fogo no lote
e a chama me atrai.
Vou me atirar
na grelha da sarça,
esturricar o peixe.

Uma fumaça
linda
subirá aos Céus.

Dirão: - Burra.
Acabou com a sorte,
acabou consigo.

Sorte
não tem espírito.
Enquanto a crosta
se forma preta
em cada escama,
um gemido de alívio
virá à tona
no mesmo instante.

Foto de Markus Koljonen


Licença Creative Commons
Atribuição: Ana Paula Camargo (acatolica.blogspot.com).
Este trabalho está protegido
por uma LICENÇA CREATIVE COMMONS.
Clique no Link para conhecê-la.