17 de janeiro de 2013

Paixão por lápis e livros

Remexer numa caixa antiga, cheia de lápis de cor,
a fim de distrair o meu filho,
me fez pensar na infância e na brevidade da vida de todos nós...

(Imagem: fotografia de George Hodan)

Costumo pegar uma série de objetos durante as refeições do Jaime Augusto. Desde brinquedos até porta-copos, rolos de fita crepe, controles remotos de DVD... Tudo para distrair o meu filho, de modo que ele coma tudo. Hoje, passando o dia na casa dos meus pais, abri uma das gavetas do quarto de TV e encontrei uma caixa, a qual já tinha visto antes, porém não havia reparado bem.

Ela está repleta de lápis de cor. Antigos: quase todos sem ponta. Retirei-a da gaveta e dei-a ao Jaime Augusto - o qual, para a minha surpresa, não deu muita bola. Eu dei. E em vez de ele curtir o "brinquedo improvisado", fui eu quem me encantei com todos aqueles lápis (deve haver uns 50), de cores mil. Alguns mordidos, outros descascados. Todos, como eu disse, sem ponta.

Jaime Augusto terminou de almoçar e eu fiquei remexendo a caixa, me lembrando de quando mamãe os adquiriu. Fui me lembrando dela ensinando a mim e a minha irmã, Andréa Cristina, que havia outras cores além do rosa, do azul e do vermelho: existiam o ocre, o bonina, o verde-água... Ocre. Bonina. Verde-água. Achei chiquérrimo saber essas cores. Os nomes "sofisticados" delas.

Lápis na cor Ocre

Fotografia de Ana Paula~A Católica (acatolica.com)

Lápis Bonina e, à frente, o Verde-água

Fotografia de Ana Paula~A Católica (acatolica.com)

Contudo, mais do que recordá-las, foi gostoso verificar, em alguns daqueles lápis de cor, o meu nome e o de minha irmã cuidadosamente escritos pela Mamãe Gali. Ela pegava a Gillette, retirava uma lasca do lápis e escrevia de caneta BIC azul: "Ana Paula". Ou "Andréa Cristina". Desse modo, não haveria como nossos lápis se misturarem com os dos outros colegas. Cada um poderia levar de volta pra casa o que era seu.

Minha mãe passava a Gillette nos lápis,
a fim de registrar o meu nome e o de minha irmã

(Fotografia de Ana Paula~A Católica - acatolica.com)

Engraçado.

Até hoje sou encantada com material escolar.

Quando vou às livrarias (meus lugares favoritos), sempre dou um pulinho na parte de papelaria, a fim de ver as novidades. Uma menina ainda vive - e vibra - em mim. Gosto de admirar os lápis, as borrachas e os apontadores cor-de-rosa, de contemplar a linha multicolorida da marca Faber-Castell: "Numa folha qualquer, eu desenho um sol amarelo.../ E com cinco ou seis retas é fácil fazer um castelo..." - como na propaganda que ia ao ar há uns 1.000 anos na televisão. Canção do Toquinho.

Falando em papelaria, conheci uma mulher, então mãe de um casal de filhos na faixa dos 20 anos de idade, que tinha uma enorme coleção de canetas e lápis, distribuída em prateleiras... Mesmo sem que eu fizesse pergunta alguma, ela se justificava: "Não posso ver lápis nem caneta. Se entro numa loja, preciso levar todos!...". É que, na infância, sua mãe não teve condições de lhe comprar materiais novos para a escola. Ao crescer, quis ter tudo.

Fotografia de George Hodan

E falando em privações materiais na infância, minha mãe me mostrou certa vez uma cartinha que escreveu aos cerca de 12 anos de idade a uma de suas avós. Com aquela letrinha linda, caprichada, mamãe pedia a uma delas, cheia de dedos (como dizemos aqui no Brasil), com muito cuidado e delicadeza, pisando em ovos (também como dizemos aqui no Brasil), que lhe comprasse um livro que os professores pediram, porque seus pais (ou seja: meus avós) não tinham condições de lhe dar.

Depois de ler essa cartinha antiga, de mil novecentos e abobrinha, meu coração ficou apertadinho, meus olhos, cheios de lágrimas. Fiquei pensando que mamãe não podia adquirir um único livro, e hoje minhas estantes estão repletas deles!... Parece que, com as minhas preferências, as minhas escolhas, vivo o que mamãe não pôde viver. Como aquela mulher que conheci, também "não posso entrar numa livraria e ver um livro, que acabo comprando-o"!...

Eu entendo a paixão por lápis e livros.

Com um lápis, registramos pensamentos, compromissos, ideias. Os livros sintetizam pesquisas, guardam o conhecimento que só se revela a quem se dispuser a adquiri-los, abri-los e lê-los. Ambos, lápis e livros, conservam e perpetuam uma parte da vida. Desta vida de cada um de nós, tão linda e tão breve. Vidas que, num dia, tal e qual a borracha faz, serão apagadas do mapa. Só restarão as memórias registradas em páginas. Ou em uma cartinha, como a que a minha mãe escreveu a uma de suas avós...




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Atribuição: Ana Paula Camargo (acatolica.blogspot.com).
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