O mergulho

Foto de Dmitry Terekhov from Odintsovo, Russian Federation

Um vulto bem-identificado

alguém ao poente vai mirar:

é o Sol com seu corpo queimado

se refrescando inteiro no mar.

Lua

Foto: Moonset in Warrumbungle National Park - Autor: Poidabro

Gira e percorre de lado a lado

mas até o clarão ficar rente;

quando então feito bicho acuado

vai entrar na toca no poente.

Inevitável

Tela: Sea coast at night. Near the beacon (1837), Ivan Aivazovsky

O insone, na escuridão, embarca

e num mar de estrelas ondeia inteiro.

Até de manhã (finda a jornada)

de escapar da náusea, não acha jeito.

Estafa

Foto de Ramesh NG

Como quem sente cansaço

eis a Lua a noite toda

com seu planar arrastado

até que a Oeste ela pousa.

Paquera

Foto de Bucare2011

A postura dele renitente

acaba abafando qualquer clima.

De fato a lagoa é atraente,

mas enche o luar ficar em cima.

Certinha

Imagem: Panorama of the Eight Views of
Kanasawa under a Full Moon (1857), Utagawa Hiroshige

Quisera a Lua desviar do poente,

mas quem não é gauche só anda na linha.

A sua rota acertada previamente

nunca contempla atalhos nem avaria.

Queima

Foto de BWinowin

Depois de um dia inteiro em brasa,

chega a hora da ruína

quando a Oeste a tarde acaba

e o Sol se reduz a cinzas.

Metáfora

Imagem de Andrea Stöckel

Aos insones, nunca falha:

toda noite é intranquila

saltando muito exaltada

feito uma corça ferida

em meio à mata fechada.

Parceiras

Imagem de George Hodan

No ermo da escuridão 

um tanto quanto assustadas

a Lua e as estrelas vão

com suas mãos quase dadas.

Excitação

Foto de Adrian Michael

Na sombra é fácil não ter compostura -

que o diga a noite (mesmo enluarada).

Ninguém vê, mas a sua pele escura

vive constantemente arrepiada.

Stress

Imagem de Tobias Kleinlercher / Wikipedia

Pra tirar da noite a tranquilidade,

basta a abóbada ficar povoada.

E ela suporta o que à manhã não cabe:

um enxame de estrelas endiabradas.

Paradoxo

Foto de Alan Kugelmass

Quem de baixo observa a Lua

acerta em julgá-la morosa:

mesmo tendo a compleição dura,

sua postura é langorosa.

Lua

Tela: Factory in the Moonlight (1898), Maximilien Luce

Cândida até na aparência,

olhar algum a inibe.

Dá de ombros pra decência

quem, o tronco nu, exibe.

Lua

Tela: Moonlight (1874), Winslow Homer 

Sua meta era um corpo coeso - 

e investe nisso até o fim.

Mas o luar lhe escapa entre os dedos

e ela falha em reter-se em si.

Luar

Imagem: Moonlight on the Potomac, Maryland (after 1898)

Assim ela aguenta

não fica à míngua

lá no infinito:

a Lua sedenta

estica a língua

e lambe o rio.

Vista cansada

Foto de Petr Kratochvil

De tanto mirar bem um por um

sem se dar a piscar um bocado,

de noite depois de tanto zoom

os olhinhos do céu ficam lassos.