Tela: Maiss Auras (ca 1900), John Lavery |
Fiquei animada:
descobri que gosta
de Pessoa.
Eu também -
embora o ache
maluco.
Pra quê, porém,
ficar contente,
se nossas vias
não bifurcam?
Nada
das ovelhas de Caeiro
nem
de Álvaro de Campos.
Você circula
na Serra;
cá estou no Oeste:
rente à poeira,
aos calangos na terra.
Lá fora,
um barulho
persistente
de vaca ruminando.
Me pergunto
pra quê amar
quem é tão vário
e vai tão alto.
Mais o tempo
passa,
ficamos brancos,
sem memória.
Quem vai repor
os azulejos
que contam
nossa história?
Fecho o Pessoa,
abro as mãos,
deixo a alegria
ir.
Pra quê tesouro,
sem porquê
d'ele existir?
Tela: In Gedanken (por 1905), Félix Armand Heullant |