Foto de Petr Kratochvil |
Li um texto hoje sobre uma criatura nunca vista antes. O animal, um tipo de verme marinho, foi identificado por pesquisadores do Schmit Ocean Institute durante uma expedição nas águas profundas do oceano Pacífico, na costa do Chile. A espécie, que desliza através de cerdas reluzentes, vive numa região cuja profundidade chega a mil metros, sendo alcançada por um robô submarino. Fiquei pensando nas grandes descobertas reservadas a quem se dispõe a ir fundo...
A questão é que um bom mergulho dá trabalho! Haja tempo, disposição, insumos. Tão mais fácil ficar na superfície, aonde muitos já foram e que não deixa lugar pra surpresas.
Com a Bíblia acontece o mesmo. As Escrituras são um oceano. Alguns, por praticidade ou comodismo, preferem nadar no raso. Outros providenciam materiais de apoio (como dicionários e comentários), senso crítico e bastante humildade pra descobrir novos sentidos. Todo desbravador deve partir do princípio de que no fundo habita o que é raro e merece ser conhecido e divulgado.
Ficar na superfície é aparentemente seguro: aqui se está sujeito a acidentes, como um afogamento. Este acontece, quando minha leitura é fundamentalista. Ou seja: quando me apego à letra sem o devido contexto. É preciso cuidado, pra não fazer como os fariseus, que pescavam uma lei e a absolutizavam. Foi o que fizeram com a lei do sábado, tornando-a mais importante do que a misericórdia.
Quando me proponho a ir fundo, devo entender que não vou encontrar o que espero.
O livro do Deuteronômio, para ser compreendido, precisa ser confrontado com os resultados das pesquisas arqueológicas, por exemplo. Quando me dou conta de que ele passou por várias mãos, durante alguns anos, aceito que ele tem camadas com intenções diferentes, contraditórias até. No mesmo livro, há um Deus que pede cuidado com estrangeiros, órfãos e viúvas e outro que é opressor. Porque vou fundo, entendo que as passagens misericordiosas são a camada mais antiga e esta prevalece.
Não se emerge o mesmo depois de um mergulho desses, que abala o que até então era tido como desbravado, assunto encerrado. Conforme o texto que li hoje, os estudos do ecossistema das águas profundas do Chile são essenciais para ampliar o que se sabe sobre o oceano e melhorar os esforços de proteção daquela área. Aprofundar-se na Bíblia visa igualmente a ampliar nosso saber e nos proteger do fundamentalismo, que torna as pessoas intolerantes e o mundo, um lugar pior.