Tela: Pão da Vida (O Milagre dos Cinco Pães) - 2022 - Andrei Mironov (CC BY-SA 4.0) |
O Padre Júlio Lancellotti, da Pastoral do Povo da Rua da Arquidiocese de São Paulo, dividiu nesta semana com seus seguidores que vem sendo perseguido justamente por pessoas que se dizem católicas. Entre elas, de acordo com o Instagram do sacerdote, estão: Ângela, "católica missionária, pregadora da comunidade Canção Nova"; Pablo, "missionário, cantor e compositor católico"; Camila, "pregadora católica, catequista, pró-vida e tradismatica", e Eudes, "missionário católico há mais de 15 anos". Padre Júlio não divulgou o teor dos ataques - todos aparentemente virtuais -, mas qualificou-os de desumanos.
Chamou-me a atenção a maneira como todos se descrevem em seus perfis no Instagram. Especialmente, o "tradismatica" de Camila - provavelmente, uma junção de tradicionalista com carismática (vá saber...).
Os quatro autodeclarados católicos passaram-me uma impressão de soberba, como se soubessem o que é ser católico De Verdade, como se merecessem um lugar de VIP nos céus. Lembrei-me das instâncias da mãe dos filhos de Zebedeu junto a Jesus, para que Ele ordenasse que Tiago Maior e João se assentassem bem a Seu lado no Reino. Como se isso chancelasse que os dois eram mais importantes do que os demais discípulos. Ante a indignação destes, porém, Jesus esclareceu: "Quem de vocês quiser tornar-se grande, seja aquele que serve a vocês. E quem de vocês quiser ser o primeiro, seja o servo de vocês".
É sintomático que, porque segue à risca essa orientação de Jesus, Padre Júlio seja tão perseguido. Desde 1985, há quase quatro décadas, ele distribui café da manhã, itens de higiene pessoal, roupas e até livros para os moradores de rua. Diariamente. É um católico que, antes de Jorge Mario Bergoglio se tornar Papa Francisco e criar a Igreja em Saída (saída do centro para a periferia das cidades e do mundo), já atuava além do altar, junto aos pobres. Junto àqueles entre os quais Jesus fez questão de circular.
Para alguns católicos, função de padre é salvar almas, e não vidas. É falar do pós-morte, da Eternidade, e não do presente. É cuidar da parte espiritual, em vez de se embrenhar em assuntos da carne, como a fome. Ainda bem que, mesmo a contragosto de alguns, a Igreja Católica é plural e nela não cabem só os que pensam que assunto de padre é "vida eterna". Nela, também tem espaço para os que, como Jesus, vieram para dar o pão num café da manhã numa rua de São Paulo. Padre Júlio veio para servir.