Tela: Hochbahnhof Bülowstraße bei Nacht (1922), Lesser Ury |
A chuva
desaba lá fora.
Faz barulhão.
A chuva, em si,
tem som de nada.
A batucada se dá
onde ela bate.
É uma ópera e tanto!
Vai num crescendo,
explode,
depois retrai
outra vez.
Talvez eu
assista pela janela
suja,
mas não.
Melhor manter
persianas fechadas,
ouvir o som,
adivinhar movimentos.
Mesmo porque
já vi tudo:
a rua deserta,
as árvores chacoalhando,
um carro, dois
que passam,
a sacola
biodegradável
que se arrasta vazia,
louca, sem entender.
E tudo branco, cinza;
cinza; cinza; cinza.
Pedro de mau humor
deve ser isto:
a ópera retumbante
Cai a Chuva.
Parou.
De repente, sumiram:
crescendo, explosão,
recuo.
Foi-se o som
que preenchia a matéria.
Esta massa imensa
de gravidade e oxigênio.
Neste instante,
ficamos eu
de camisola
no sofá,
a janela suja, fechada
e o ruído dos desejos
e pesares
na minha mente.
Tela: Whitehall. Twilight. The rain (2006), Simon Kozhin/С.Л.Кожин |