Foto: Plastik Lenins und Stalins auf der Leipziger Herbstmesse 1954 - Autores: Roger e Renate Rössing - Fonte: Deutsche Fotothek |
As mudanças acontecem
como a queda de uma
folha (seca) da árvore
frondosa de caule (velho)
na esquina
do quarteirão de cima -
na qual, certa vez,
vi duas borboletas
se amando. (Pena
não ter máquina na hora.)
Pranchetas, papéis
desenrolados brancos
com quadradinhos
de linhas azuis,
réguas grandes e pequenas,
compassos, calculadoras
imensas e pretas
na mesa inclinada -
nada. Nada
pode prever como
nem quando
as mudanças acontecem.
De repente, assim,
num almoço
me vi gostando de
quiabo. E também de
azeite.
Parece trivial - indigno
de menção -, mas
até hoje me causa
pasmo
me ver braços e mãos
pondo quiabo no prato.
Ninguém me convenceu.
Não li na revista
que faz bem.
Um dia me vi
pondo quiabo no prato.
E comendo.
Estou aberta
às mudanças.
Digo: "Prazer, entrem".
Eu as recebo, sorrio, sirvo
café, as acolho,
acarinho, abrigo.
Têm passe livre
em mim. Comigo.
A estátua sisuda
é bonita:
mostra a pujança
que se busca em si.
Ai de nós, no entanto,
não ser maleável:
partiremos em três -
pernas, pescoço, peito -
como Stálin ou Lênin
uma vez.
Parte da vida
é isto:
tomar distância longa
do ponto de que partiu.
A mulher que escreve
agora
pouco traz
da de outrora.
Somos duas.
Quem me amou ontem
tem todo o direito
de não me saber mais.
E ignorar,
fingir que não viu,
sair do meu
círculo.
Sem olhar para trás.
Foto: Part of Stalin and Lenin Monument by Rudolf Doležal and Vojtěch Hořínek in Olomouc, Czech Republic (2005) - Autor: Jan Jenista |