10 de abril de 2014

Página de Diário

Tela: Lunia Czechowska with her left hand on her cheek (1918), Amedeo Modigliani

Meu ouvido coça
às vezes.
Em vão aliviar
com ponta do indicador -
parto pra cotonete.

Aperto a haste azul,
roço o algodão
bem no ponto que pinica.
(Gostoso.)

Li que ouvido e garganta
se ligam.
Talvez me coce a boca,
em vez da orelha. Talvez.

Resolve tocar
no ouvido.

Como se lhe fizesse
um carinho,
pelo que sofre
de noite, de dia.

Meu ouvido escuta
o que não merece:
torpezas, vilanias.
Não há Chopin
que desoprima.

Eu devia seguir Pinóquio:
ter um grilo
ao pé do ouvido,
pra me soprar
canção amiga;
pra me beijar
ossinhos que vibram;
pra me passar
qualquer esperança
e valer a vida.

Apesar dos ruídos,
do que entra pelo ouvido,
e não sai pelo outro.
Tudo o que fica, espeta.
E causa dor.

Tela: Woman with Black Cravat (Sem Data), Amedeo Modigliani (1884-1920)


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Atribuição: Ana Paula Camargo (acatolica.blogspot.com).
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